domingo, 12 de junho de 2011

ENTREVISTA EXCLUSIVA AO JORNALISTA DA TVI, JOSÉ GABRIEL QUARESMA


José Gabriel Quaresma é jornalista na TVI na área do desporto juntamente com a sua esposa, editora de política, Carla Moita. Leia agora as revelações surpreendentes feitas pelo jornalista em exclusivo.


1) O Zé considera-se mais lisboeta ou ribatejano?

Sou de Vila Franca de Xira, mas fui nascer a Lisboa. Sou ribatejano, mas ter nascido em Lisboa dá-me o rótulo de “Alfacinha”, permite-me dizer, quando me dá jeito, “nasci na capital”, mas é a alma ribatejana que me enche de orgulho. Crescer naquela vila, (agora cidade) foi algo de maravilhoso. Fui criado pela minha avó, até ao dia da sua morte, pelo que frequentávamos os melhores cafés da cidade, comíamos sempre em restaurantes… fomos a primeira família a ter televisão em Vila Franca de Xira, a vila (cidade) tinha uma dinâmica muito especial, famílias burguesas que se misturavam com famílias de trabalhadores, a lota, as varinas, as brincadeiras nas ruas, íamos aos outros bairros atacar os nossos inimigos com flechas feitas com as varetas de chapéus-de-chuva velhos, fazíamos jogos de hóquei “sem” patins, os jogos de futebol no campo da “Mina” ou na “Rua de Trás”, com bolas feitas de espuma e couro, que o senhor Luís “Correeiro” nos dava, as corridas com carrinhos de rolamentos, os peditórios para as festas dos santos populares, as esperas de touros, os mergulhos no Tejo, e tanta, tanta coisa que não cabe neste texto, mas que faz parte do meu ADN. A minha namorada eterna…crescer em Vila Franca, naquela Vila Franca foi das coisas mais belas da minha vida.

2) Quando era mais pequeno, o que o fascinava mais na televisão, séries, programas… Quais e porquê?

Tantas…Tarzan, Pipi das Meias Altas, Sítio do Pica-Pau Amarelo, Bonanza, Uma Casa na Pradaria, Os Marretas, Rua Sésamo, Gabriela Cravo e Canela, Escrava Isaura, Sandokan, Verão Azul, Cornélia, 1,2,3, podia estar aqui um dia inteiro…na televisão em particular, nessa altura, nada me fascinava, nas séries e programas fascinavam-me as personagens, as histórias, eu seguia tudo aquilo, sabia a que horas passava, em que dias… naquela altura a televisão era a única alternativa à rádio, que me fascinava muito mais, enquanto plataforma de comunicação, sentia que havia na rádio, mais magia. Hoje sou jornalista, e há um nome da televisão, desse tempo e deste, que me marcou profundamente, Carlos Pinto Coelho.

3) Era bom aluno a português? E a Matemática?

Eu sempre fui bom e mau aluno. Os professores chamavam a minha mãe a escola e diziam-lhe “o seu filho é um dos melhores alunos da turma, mas é o que mais distrai os outros”. Por isso nunca fui além do “4”. Nunca tive um “5”. Era melhor aluno a Português que a Matemática, aliás, era melhor aluno a tudo, menos a Matemática. Isto no secundário, porque na primária era bom aluno nas duas disciplinas. Mas safei-me sempre. A Português, porque com o pouco que eu sabia, com a simpatia dos professores (ganha a custo – risos) e com o que a minha namorada escrevia na carteira (como tinha aulas na hora antes da minha turma deixava-me as respostas dos testes escritas na mesa) conseguia sempre ter acima dos 60%. A Matemática, havia o Luís Câncio que me fazia os testes…Hoje, sou muito melhor, sem dúvida, a Português que a Matemática.

4) Com que idade chega à conclusão que o jornalismo seria a sua vocação?

Aos 22 anos. Nunca tive o “sonho” de ser jornalista, aliás, nunca tinha dormido sobre o assunto. Mas a tal namorada de que falei antes (minha mulher) foi editora na Rádio Renascença muito nova, e nessa altura, seguia o seu trabalho, e comecei a apaixonar-me pelo jornalismo. Tomada a decisão, fui em frente, derrubei algumas barreiras e cheguei ao meu destino.

5) Onde se forma?

Até aí fui privilegiado. Fiz o primeiro e único curso de dois anos no CENJOR, Formação Geral em Jornalismo. Fui o primeiro em rádio, o segundo em televisão, o quarto em foto-jornalismo e o sexto em imprensa. Tive professores, do melhor que existe, fosse em disciplinas técnicas, ou em disciplinas complementares. Joaquim Furtado, Cesário Borga, Manuel Tomás, Dias Miguel, Mário Contumélias, Fernando Cascais, estes alguns deles. Fui um dos 13 apurados entre 1200 candidatos, mas só entrei à terceira tentativa. Sou do curso a seguir ao da Catarina Furtado. Velhos tempos. O CENJOR é, para mim, a melhor escola de formação de jornalistas, em Portugal. E eu, digo-o com orgulho, sou um dos “formandos” que ainda hoje, 19 anos depois, ainda sou lembrado por toda a gente. Isso enche-me de orgulho. Depois, formei-me lá, como formador certificado, e formei lá, muitos jornalistas que hoje estão na primeira linha. Fui professor de alguns nomes conhecidos da nossa praça.

6) Qual o seu primeiro trabalho em jornalismo?

Uma volta a Portugal em Bicicleta. Estava eu a começar, na Rádio Ribatejo, na Azambuja. Foi uma emoção!

7) Lembra-se do seu primeiro directo em TV. Que acontecimento estava a cobrir ou relatar?

Lembro-me perfeitamente. Foi em 1994, no Estádio Nacional, foi um directo para o programa Contra-Ataque, da TVI, que depois tive o prazer de o apresentar durante muitos anos. Era o Humberto Pereira, o cameramen que estava comigo. Era uma manhã de sábado, o Benfica treinava no Jamor, não me recordo porquê… Lembro-me que as palmas das mãos não secavam, ao contrário da boca, totalmente seca. A partir desse directo, a televisão em Portugal, nunca mais foi a mesma…

8) Dentro do jornalismo, considera-se um jornalista de desporto, ou gosta de fazer de tudo um pouco?

Há um ano e meio deixei a editoria de desporto. Fui convidado para a equipa de Grande Reportagem da TVI, onde permaneço. Durante os quinze anos que trabalhei no desporto da TVI, nunca me considerei jornalista de desporto. Há jornalistas, ponto. Há depois, jornalistas que ao longo da carreira vão trabalhando determinadas áreas e que, por isso, ficam mais conhecedores dessas matérias. Eu, gosto de fazer de tudo um pouco, e faço. Em televisão fiz praticamente tudo, directos, reportagens, falsos directos, apresentação, tudo o que se possa imaginar. Neste momento, por exemplo, numa altura de mudanças na TVI e de convulsão no país, quando estou disponível, faço de tudo um pouco. Hoje, cada vez mais, um jornalista deve especializar-se em nichos, mas como costumo dizer, um bom jornalista é aquele que é especialista, em generalidades. Mas foi garantidamente o desporto, a melhor escola que podia ter, e que tantas portas me abriu. Devo ao desporto a minha carreira.

9) Como surgiu a oportunidade de redigir o livro de Pedro Mantorras – Livro Directo?

Na altura, eu e o Pedro éramos muito amigos. Um dia, ele veio a um programa da TVI e fomos almoçar. Não falámos do livro. À noite telefonei-lhe e perguntei-lhe: “Pedro, toda a gente tem um livro, não queres que eu escreva o livro da tua vida?”, e ele respondeu de imediato que sim. Seis meses depois, saía o Livro Directo, que foi top de vendas durante dois meses. Só foi pena termos editado o livro com a PrimeBooks, uma pequena editora, que não funciona nada bem, não promove os seus autores, e é gerida por uma pessoa muito mal formada. Se tivéssemos escolhido uma outra editora, o Livro Directo tinha sido um enorme sucesso, mais do que foi. Aliás, a editora é tão, diria, pouco ortodoxa, que eu e o meu advogado estamos a preparar uma acção para apresentar em tribunal, pois o livro foi publicado em Angola, à minha revelia. Há muitos milhares de euros desse negócio por liquidar, mas isso é um assunto para os tribunais. Apenas dizer, que comecei a tornar-me próximo de Mantorras, e vice-versa, quando estava a recuperar de uma operação ao meu joelho, numa clínica onde estava ele e Nuno Gomes. Ficámos amigos, até ao momento em que ele participou com o editor na alta traição de que falei.

10) Como se encontra o processo gerado em torno desse mesmo livro, pelo médico Bernardo Vasconcelos? Acha que havia motivos para a abertura desse processo?

Se havia motivos ou não, não me cabe a mim dizer. Bernardo Vasconcelos sentiu-se ofendido e processou-me, a mim, ao Mantorras e ao Benfica, curiosamente, não processou a editora, vá-se lá saber porquê? Mas se Bernardo Vasconcelos entendeu ter motivos de queixa, já o tribunal entendeu o contrário, no que a mim diz respeito. O que vou contar, não é público, aliás, é a primeira vez que é tornado público, o juiz de instrução decidiu não me pronunciar, pelo que eu, não vou a julgamento, ao contrário de Mantorras, mas apesar de sermos ambos arguidos, tínhamos defesas separadas, aliás, segundo o que me foi dado a saber, Mantorras nem compareceu no tribunal, nem eu... Dizer também, que Bernardo Vasconcelos chegou a ser expulso, pelo juiz, da sala de audiências por comportamento incorrecto. Eu sempre estive tranquilo. Se tivesse ido a julgamento tinha provas materiais para apresentar, mas ainda bem que não fui. Em 19 anos de profissão fui seis vezes a tribunal por crimes relacionados com abuso de liberdade de imprensa. Nunca fui condenado.

11) Uma das situações pelas quais o Zé ficará conhecido, é sem dúvida a queda do seu pivot (dente) em directo. Afinal o que se passou? Tinha ido há pouco tempo ao dentista, sentia-o mexer…

Hoje dá vontade de rir… Na altura foi muito mau. Estava no décimo oitavo directo do dia, eram perto de três da manhã. Vale e Azevedo tinha acabado de ser eleito presidente do Benfica, era a loucura dentro do pavilhão. Quando ele entrou fomos literalmente abafados pela multidão, perdemos cabos, auriculares, perdi o contacto visual com o cameramen. Quando Vale e Azevedo termina o discurso, já estava eu a fechar o último directo daquela longa operação especial, cai-me o dente da frente. Era um pivot que durava há uns quinze anos. Não abanava, não dava sinais de querer cair, mas caiu. Às quatro da manhã vieram dar-me o pivot de volta, tinham-no encontrado. Eu estava sentado numa cadeira, no meio de um pavilhão vazio, a deitar contas à vida…a reacção foi, “tenho que assumir isto!” (tudo em segundos) e assumi, foi o melhor que fiz, entrei para a história da televisão em Portugal e no mundo, pois não há registo de tal coisa ter acontecido a nenhum jornalista, em nenhuma televisão. Eu, neste caso, sou único.

Zé Gabriel quaresma fica sem o pivô em directo (5:10 min.)


12) Como é lá em casa, uma jornalista da área da política, Carla Moita, outro ligado ao futebol. Há entendimento possível?

Eu conheci a minha mulher em 1985, pelo que nós tornámo-nos jornalistas muito depois disso. Já foi mais fácil separar as águas. Ela, trabalha na TVI (também) há uns 12 anos, e sempre como editora de política, por isso é complicado não levar trabalho para casa. Mas sim, tem que haver entendimento…

13) O seu filho Rodrigo já pede ao pai para ir assistir aos jogos de futebol?

O Rodrigo já tem onze anos. Joga futebol federado (parece o Saviola) há seis. É ele quem me pede para ir ao futebol e eu vou, vou ver os jogos dele, para o ver e sentir a sua alegria. Depois, vamos também ver os jogos do Benfica. São momentos únicos, depois dos jogos vamos comer o nosso bife, como dois bons amigos lampiões.

14) A Maria ou o Rodrigo, algum sente especial apetência pelo jornalismo? Gostava de ver um filho seu nestas andanças?

Nunca pensei nisso, como qualquer pai, gostava que eles fossem aquilo que quiserem. Apetência, penso que não sentem nenhuma. Tanto um como outro, estão muito habituados a estar na TVI, vêm cá desde sempre, estão habituados a ver os pais na televisão. É algo que para eles é normal. Ambos gostam de ver as minhas reportagens, mas não mais que isso. Quando os pais estão em directo, ou a apresentar alguma coisa, eles só vêem quando estamos longe há muito tempo e já sentem saudades, aí, vêem para matar saudades, não mais que isso. A Maria quer ser actriz e o Rodrigo jogador de futebol.

15) Como vê a actual situação económica do país? Acredita que ainda há muitas medidas de austeridade a ser postas em prática?

Nesta matéria, assumo-me como um revoltado. Penso que os líderes políticos, que estiveram no poder e na oposição, durante os últimos dez anos, deviam responder criminalmente. Sinto-lhes um asco tão grande que não vou responder a esta pergunta, mas ainda acrescento, o povo português, na sua maioria não mereceu que tivessem lutado pela liberdade. O povo é oprimido por meia-dúzia de homenzinhos com gravata. É criminoso o que fizeram à minha geração, à do meu irmão, à dos meus pais e dos meus filhos. É criminoso. Sou a favor da presença da Troika. Pelo menos assim não me sinto roubado gratuitamente, para sustentar uma elite sem respeito. Assim sou roubado, para limpar a porcaria que essa elite fez e continua a fazer, mas sem a sensação que lhes estou a alimentar os caprichos. Eu penso que Portugal tem solução, tivesse políticos decentes. Assim… (vejam a campanha eleitoral) gastamos alguns milhões com eleições, nós, que não temos dinheiro para pagar o IRS do MAI…Isto é de loucos e nós participamos como actores nesta alucinação de Sócrates, Coelho, Portas e afins... É revoltante, mas pelo que parece só eu me revolto. Tenho que tomar Valeriana para aclamar!

16) Como é que vê o jornalismo do século XXI? Acha que existe pressão política nos meios de comunicação social?

Pressão existiu sempre, não é de agora, nem é um fenómeno da era moderna. A questão não está na pressão, mas em deixarmo-nos pressionar, ou não. Falo de pressão exterior, porque há muitos tipos de pressão. Claro que há pressão política, também. O jornalismo tem que se adaptar a esta nova dinâmica. A Aldeia Global deixou de ser aldeia, as plataformas de comunicação evoluíram e agora uma notícia do outro lado do planeta chega-nos em segundos. A liberdade de expressão é à escala global, já não falamos para um público, mas para públicos. É uma dinâmica e por isso mesmo em constante mutação, penso que é uma questão de adaptação, nada fácil, mas possível. Antes assim!

17) Que conselhos gostaria de deixar aos futuros jornalistas deste país?

Quem sou eu para dar conselhos. Mas, posso deixar um, deixem a vaidade, a televisão, o aparecer, os decotes, deixem de querer ser apresentadores, sejam jornalistas, o que quer dizer, sejam responsáveis, cumpram o código deontológico (algo que muitos seniores não fazem) e lutem sempre, em primeiro lugar pelo direito inqualificável, que é o da liberdade de expressão e pensamento. Depois, cumprindo as regras da profissão, sejam felizes.