Leia agora a entrevista, em exclusivo, a Alexandra Borges.
1) A Alexandra é natural de Lisboa, todavia cresceu no Alentejo. O que guarda dessa infância?
Sim, sou natural de Lisboa mas felizmente cresci em Beja, no Alentejo onde se brincava às escondidas na rua sem medos e com a garantia de uma infância com muito campo, liberdade e felicidade!
2) Quando andava na escola qual o (a) professor (a) que mais a marcou?
A Dona Leonor porque foi quem me ensinou a ler e a escrever. Era rigorosa, dava reguadas mas mostrou-me que com várias letras podemos escrever o mundo…
3) Desde sempre quis ser jornalista?
Sabia que queria ser comunicadora. Poderia ter sido apresentadora de TV, animadora de rádio ou qualquer outra coisa…desde que lidasse com o público! O jornalismo foi surgindo na minha infância como o caminho mais interessante e hoje digo que não tenho um emprego, nem um trabalho, mas um privilégio que me dá muito prazer!
4) Durante a sua infância quem eram os jornalistas que idolatrava na TV?
Miguel Sousa Tavares, Margarida Marante e Barata Feio…todos pela capacidade de comunicação e pelas grandes reportagens que assinavam.
5) Onde se forma?
No único curso de Comunicação Social que havia em Portugal…o da Universidade Nova, na altura, muito teórico, chato e virado para a imprensa escrita!
6) Qual foi o seu primeiro trabalho em jornalismo?
Não me lembro…mas recordo-me que um dos primeiros foi uma ama de acolhimento da segurança social de Vila Franca de Xira que tinha ao seu cuidado 2 irmãos e “matou” (por falta de auxilio e negligência) a menina de 5 anos e foi para a cadeia. Quem deveria ter ido para a prisão eram as técnicas e psicólogas da segurança social que colocaram os irmãos em casa da ama sem sequer a investigarem e, durante um mês, foram feitas várias denúncias escritas por maus tratos e os irmãos foram assistidos por várias vezes no hospital! Era uma morte evitável que me revoltou e que ainda hoje me indigna…pelos vistos, as técnicas da segurança social, continuam a dormir tranquilas…é o país que temos!
7) Como e em que ano surge a oportunidade de vir trabalhar para a TVI?
Comecei na TVE, como produtora e, quando surgiram as privadas fui convidada para as 3 e, na altura, optei por ir para o telejornal da RTP1 onde, pelos vistos o José Eduardo Moniz acompanhava de perto o meu trabalho sem eu nunca me ter apercebido…quando foi para a TVI, convidou-me e foi uma honra trabalhar com ele!
8) Qual foi a primeira grande reportagem que assinou na TVI?
Foi um acaso… Acho que foi um caso de subtração de menores…um pai que, se fechou num quarto de hotel com a filha de 3 ou 4 anos porque a mãe da menina não o deixava ter contactos com a criança. Recebi o telefonema na redação da TVI cerca das 13h e a grande reportagem (25 minutos) estava acabada às 20h e pronta para ser emitida…
9) Como nasce a reportagem de investigação em televisão?
A ideia, normalmente, parte do jornalista mas tem que ser aprovada pela direção de informação. Depois seguem-se muitos contactos informais e recolha de documentação para escolher os entrevistados, o ângulo de abordagem e um fio condutor que ajude o telespectador a entender a história…a etapa seguinte são as filmagens, visionamento do que se filmou, escrever e organizar a história e montá-la com um editor de imagens…a fase final é a escolha da música e do grafismo. Há países em que levam 3 anos a fazer uma grande reportagem…por cá demoramos cerca de um mês!
10) Acha que o documentarismo tem uma duração definida?
Acho que deve ser decidido caso a caso… Não gosto de regras fixas!
11) Há situações em que tem de estar longe dos seus gémeos. Eles já pedem para ver a mãe na TV, ou passa-lhes completamente ao lado?
Odeiam tudo o que tenha que ver com a TVI porque sentem que lhes rouba a mãe…nunca lá quiseram ir e recusam-se a ver a mãe na TV… Estou a esforçar-me para que entendam que eu amo aquilo que faço, como desejo que, um dias, também eles se divirtam a trabalhar tanto como eu…Mas, quando os telespectadores me abordam na rua para me darem os parabéns pelo meu trabalho, sei que sentem um orgulho muito grande…
12) Uma das reportagens que a marcou certamente foi « Infância Traficada», onde esteve alguns dias. Como nasce esta reportagem?
Foi uma reportagem em que tive que lutar com a Direção de informação da TVI para a fazer mas que, quando voltei, foi o programa mais visto do dia, do mês e do ano…chegando a ultrapassar a novela de prime time. Foi um orgulho é certo e, só depois do sucesso deste trabalho, a Direção de Informação iniciou um espaço informativo autónomo de grande reportagem que se passou a chamar: Repórter TVI .
13) Como descreve a sua estadia no Gana?
Éramos 2. Eu e o repórter de imagem…as televisões estrangeiras viajam com grandes equipas, nas portuguesas não há dinheiro para isso, por isso, o jornalista tem de fazer tudo! O nosso dia de trabalho começava às 6 da manhã e ia até às 20h…o que fazíamos? Filmar, filmar, filmar, filmar o máximo de material que conseguíssemos porque só tínhamos 10 dias e para montar um minuto em televisão tem que se filmar uma hora!
14) Não encontrou entraves à sua reportagem no terreno, nomeadamente pelos exploradores dessas crianças?
Claro que sim mas isso são ossos do oficio…é preciso saber lidar com isso, protegermo-nos e não colocarmos a vida das crianças em perigo e esta era a minha maior preocupação!
15) O que aconteceu às crianças que os portugueses ajudaram a resgatar com a compra do CD “Filhos do Coração”.
Estão num orfanato americano a estudar e têm o seu futuro garantido durante os próximos 10 anos graças à ajuda dos portugueses…em breve algumas poderão partir para estudar em Universidades dos EUA. A organização Touch a Life Fundation e a Pam Cope em quem confio cegamente são quem cuida, diariamente, estas crianças!
16) Tem mantido contacto com essas crianças?
Claro…sempre. São pequenos grandes milagres. Já falam inglês, tocam instrumentos musicais, fazem teatro e, o que mais me impressiona é o brilho no seu olhar e o sorriso de felicidade que elas têm estampados no rosto cada vez que a organização me envia fotografias…SÃO MILAGRES…
17) Depois de dois anos, voltou ao Gana. O que encontrou?
Alguns milagres de crianças que tinham sido resgatadas por a nossa equipa 2 anos antes…algumas que tinha identificado desaparecerem e milhares que continuam a sofrer todos os dias! É duro!
18) Sentiu a necessidade de dar voz a essas crianças?
É o mais importante porque são essas vozes que vão marcar o futuro daquele país. Tenho a certeza que, daqui a uns anos, alguma dessas crianças será eleita presidente do Gana e ela própria acabará por erradicar o tráfico e a escravatura infantil do país…e esta é a grande reportagem que sonho fazer um dia!
19) Acredita que qualquer jornalista poderá fazer uma reportagem deste género?
Francamente, acho que há jornalistas que têm perfil para este tipo de trabalhos e outros que não têm…tal como eu tenho plena consciência que não tenho perfil para fazer cobertura de, por exemplo, casamentos reais ou visitas do papa e outros colegas meus são muito bons a fazê-lo!
20) Como vê o jornalismo do século XXI? Acha que se pode falar em isenção, independência?
Acho que é difícil para um jornalista ser independente…tem que se estar disponível para pagar o preço da independência…eu já tenho pago preços muito altos por lutar pela minha isenção, dignidade, verticalidade, rigor e independência de que não abdico, nem abdicarei nunca!
21) Que conselhos gostaria de deixar aos futuros jornalistas deste país?
Que a motivação pela qual querem abraçar esta profissão seja a correta…eu dei aulas na faculdade e muitos dos meus alunos queriam ser jornalistas para serem conhecidos, viajarem e terem uma vida de aventura! Se querem isto vão para pilotos e hospedeiras de bordo!
22) Gostava que um dos seus filhos lhe seguisse os passos?
Gostava que ambos os meus filhos mantivessem a sua identidade e amassem a sua profissão como eu amo a minha…sei que assim, seriam bons no que escolhessem fazer e, sobretudo, muito felizes!