terça-feira, 26 de abril de 2011

JOSÉ MANUEL ROSENDO, EM ENTREVISTA EXCLUSIVA

O jornalista e repórter de guerra, José Manuel Rosendo, falou da sua experiência profissional.
Leia a entrevista ao jornalista.


1) O que é ser jornalista de guerra?

Ser jornalista num cenário de conflito ou em qualquer outro
sítio, é exactamente igual. As regras são sempre as mesmas. O que muda num cenário de conflito é a perigosidade e por isso devemos ter algumas cautelas. Gosto de dizer, até para desmontar um pouco o mito do jornalista de guerra, que um jornalista não é um “Indiana Jones”.É certo que há situações de risco que são impossíveis de controlar. Por mais que façamos um plane
amento ponderado e cauteloso, há factores que nos escapam totalmente. Em regra, uma situação de conflito armado significa ausência de Lei e de Ordem. São frequentes os actos de banditismo e de condições difíceis de trabalho: dificuldade de comunicações, falta de locais para pernoitar, alimentação precária, etc…

2) O Jornalista que faça um directo em pleno cenário de guerra, corre ou não perigo de vida?

Normalmente, os directos são feitos em locais relativamente seguros, quando feitos a partir dos locais onde se instalam as agências que têm as ligações por satélite. Há casos em que as equipas de televisão utilizam o satélite portátil e nesse caso podem, de facto, fazer o directo de qualquer sítio. O
perigo existe sim, quando antes desse directo andamos no terreno a ver o que está a acontecer e a captar sons e imagens para podermos transmitir essa informação. Aí encontramos de tudo. Gente amigável e outra gente que nos detesta; gente agressiva; e também encontramos quem nos ofereça alimentos e, por vezes até dormida. De facto, é verdade que um tiro perdido nos pode atingir. Mas temos consciência disso. O risco deve ser assumido, embora façamos tudo para o evitar. Mas a guerra não deve ser um espectáculo. O importante é a i
nformação e não adiantará grande coisa (em termos informativos) estar em directo e a olhar pelo canto do olho para ver se algum perigo se aproxima. Isso pode ser mostrado através de imagens captadas anteriormente, editadas e depois transmitidas. Fazer jornalismo não é o mesmo que mostrar as aventuras do jornalista.

3) O antes, o durante e a pós-participação num cenário de conflito armado. Que sensações se intercalam no jornalista?

Há adrenalina. Em casos de conflito armado é impossível n
ão haver. Há risco e portanto a adrenalina aumenta. E já agora, não convém escamotear: também há medo. Por vezes há. Tal como há emoção, porque a guerra é uma realidade que deixa um rasto marcante, nomeadamente em termos de vidas perdidas. É impossível fugir a isso, mas é importante controlar as emoções. Depende muito da preparação que cada um tem para enfrentar este tipo de situações, sendo que podemos sempre ser surpreendidos por algo inesperado. Os jornalistas não estão no terreno para ter emoções. É verdade que são seres humanos, mas já sabem ao que vão. A nossa missão é informar
e para isso temos que manter a cabeça fria e não nos deixarmos arrastar pelas emoções. Ser frio e ter distanciamento em trabalho não significa ausência de sentimentos, emoções ou valores, nem significa que o jornalista não seja humano. É uma necessidade que, se não for cumprida, coloca em risco a missão que levamos para esses cenários de conflito. Pode parecer contraditório mas ao mesmo tempo que temos de mergulhar na realidade que temos que relatar, temos em simultâneo que não nos deixar sufocar por ela.

Depois, no regresso, cada um tem que saber gerir as emoções que traz. Muitas vezes passamos duma situação de elevado stress para outra de calma absoluta proporcionada por uns dias de descanso. Há uma sen
sação de vazio. A experiência ajuda a ultrapassar essa sensação de que devíamos estar noutro sítio.

4) A «guerra das audiências» pode por em causa o trabalho do jornalista num cenário de guerra?

Um conflito armado é um palco privilegiado para a guerra da informação. É preciso muito cuidado com a informação e com as respectivas fontes. Há sempre rumores para todos os gostos. O stress que atinge os jornalistas também toca os protagonistas e isso reflecte-se na informação que passam.

Há também quem conheça bem o valor da informação e tente utilizar os jornalistas. Acontece em situações de ausência de conflito, quanto mais em situações de guerra.

Muitas vezes a dificuldade de acesso à informação dificulta a interpretação do que acontece no terreno, por isso é importante manter um contacto frequente com a redacção. Quando isso é possível.

Seja como for, ao jornalista pede-se que relate o que vê e não que faça análise política ou militar. Pode fazê-lo, mas não é esse o objectivo de alguém que vai para um local de conflito fazer reportagem.

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