domingo, 12 de dezembro de 2010

À CONVERSA COM RICARDO PINTO: ENTREVISTA EXCLUSIVA AO SUB-DIRECTOR DE INFORMAÇÃO RTP E APRESENTADOR DO «HOJE», ANTÓNIO ESTEVES

1) António com que idade e em que circunstâncias surge a sua ligação ao jornalismo?

Comecei nesta profissão muito jovem, em Março de 1989, tinha ainda 19 anos.
Foi perfeitamente por acaso. Um dia fui à Rádio Nova Antena, em Odivelas, com o meu amigo Paulo Costa que era locutor dessa rádio. Na altura juntávamo-nos todos no estúdio durante os programas uns dos outros, havia um clima de camaradagem muito bom. Estava no ar o Jorge Freitas – hoje locutor da TSF. O Jorge gostou da minha voz e pediu-me para anunciar um dos sinais horários da madrugada e lançar duas músicas. As rádios locais permitiam essas brincadeiras. Uma semana depois estava a ler notícias sobre música ao sábado à tarde no programa do Paulo Costa, e em menos de um mês tinha sido convidado pelo dono da rádio para fazer um programa de música, na sexta-feira à noite – o Norte Atlântico. Quando dei conta já eram três os programas que assinava – Norte Atlântico, Jardins de Pedra e Club Tropicana –, todos diferentes e com estilos musicais diferenciados. Também editava noticiários e vendia publicidade – hoje actividades completamente incompatíveis. Como oferecia a voz aos anunciantes – na altura creio que se cobravam dez contos (50 euros) – acabava por vender imenso. Ganhava bem por causa disso.

2) Se não fosse jornalista o que se via a fazer, profissionalmente?

Nunca imaginei fazer outra coisa. Claro que passei pela fase do piloto, do astronauta, do bombeiro, do polícia. Houve uma altura em que queria ser advogado, inspirado pela série Perry Mason.
Aos 6 anos já simulava relatos de futebol e tentava imitar o Fernando Correia, o David Borges, o Ribeiro Cristóvão, o Jorge Perestrello – que infelizmente já não está entre nós.
Um dia acordo e estou a trabalhar ao lado de todos eles, a receber elogios pelo meu trabalho (Risos). Nem queria acreditar.

3) Onde é que se licenciou?

Não me licenciei. Frequentei o curso de Direito, na Universidade Internacional em Lisboa. O Fernando Seara – Presidente da Câmara de Sintra - era meu professor. O Matos Correia – deputado do PSD, e ex-chefe de gabinete de Durão Barroso – também. Havia ainda o Narana Coisssoró e o Adriano Moreira, mas nunca me deram aulas.
Frequentei o curso até ao 3º ano, mas só completei o 2º.
Entrei para o quadro da TSF e tive de fazer uma opção. Uma parvoíce. Hoje teria requerido o estatuto de trabalhador-estudante. Mas tinha 22 anos na altura e não pensei da melhor forma. Era uma grande oportunidade que não queria deixar fugir, e na TSF não houve grande abertura como aconteceu mais tarde com outros casos.


4) Cada vez mais se fala do jornalismo enquanto um 4.º Poder que funciona em simultâneo como contra-poder. Acha que o jornalismo deve assumir essa mesma função?


O jornalismo é sempre contra-poder, porque não alinha com nenhum dos poderes instituídos. O jornalista deve colocar-se sempre numa posição de senso comum, no lugar do espectador, do cliente, do utente, do cidadão comum nas suas múltiplas facetas diárias.
Deve questionar de forma corajosa, rigorosa, isenta e distanciada, e não se deixar intimidar pelos poderes. Não é fácil. Cada vez menos.
O jornalismo é um poder por si próprio, cada vez mais mal usado. É usado de forma leviana e cada vez mais por pessoas que se servem do jornalismo e não servem o jornalismo.

5) Como é que vê a evolução do jornalismo sobretudo ao longo das últimas décadas em Portugal?


O aparecimento da TSF e da SIC foram uma lufada de ar fesco e deram origem ao jornalismo em directo. Um jornalismo corajoso, agressivo às vezes, dinâmico, interventivo, um jornalismo que não se limitava à secretária e aos telefones. Um jornalismo que punha tudo em causa, imaginativo e criativo, que ia ao fim da rua mas também estava disposto a ir ao fim do mundo. Hoje só há dinheiro para o fim do bairro (risos).
A partir de certa altura, qualquer pessoa podia ser questionada em qualquer local sobre qualquer assunto. Era uma situação incómoda que rompia com o status quo, com a previsibilidade reinante. Um ministro podia receber um telefonema às sete da manhã, ou ter um jornalista à porta e à saída de casa.
Hoje voltámos ao jornalismo preguiçoso, à secretária e ao telefone, sem confrontação de fontes e sem exercício do contraditório. Um jornalismo manhoso e comprometido com vários interesses.
Felizmente que há várias “ilhas” de bom jornalismo em Portugal que contrariam este cenário. A RTP é uma delas, felizmente.

6) A informação isenta e objectiva são características pelas quais o bom jornalismo deve primar, no entanto não considera que «por mais que se procure esse distanciamento, a personalidade do jornalista, o seu pensamento» acabam muitas vezes por demarcar determinadas posições?


Não há jornalismo objectivo. As pessoas são subjectivas quando colocam em qualquer coisa um cunho pessoal. É possível que a mesma reportagem dê origem a peças completamente distintas desde que seja feita por várias pessoas.
O que deve haver é jornalismo sério, isento, rigoroso, credível e honesto. Um jornalismo sem opinião, factual, que respeite a ética e a deontologia. Muitas vezes não há.

7) A relação entre o político e o jornalista são vincadas de um misto de ambivalências. O político precisa do jornalista para transmitir as suas ideias, opiniões e o jornalista precisa dele para informar o cidadão. Não obstante quando o jornalista entra em campos de investigação com os quais o político não concorda gera-se muitas vezes um clima de tensão. Como é que vê na actualidade esta relação?

Há uma grande promiscuidade entre os poderes políticos e económicos e uma boa parte dos jornalistas. Não devia haver.
A política pressiona os poderes económicos que por sua vez pressionam os jornalistas. Outras vezes são os poderes económicos a pressionar a política que pressiona os jornalistas.
Nós somos o ele mais fraco e as pressões são cada vez maiores. De todos os lados e das formas mais diversas e discretas. Mas não podemos ceder em nenhuma circunstância. Não é fácil.
Em Portugal toda a gente pressiona toda a gente e às vezes quem acusa os outros tem um telhado de vidro do tamanho dos Jerónimos (Risos)
Mas há pessoas pressionáveis, outras não. Resisto a isso ignorando as pressões.
.


8) Estreou recentemente juntamente com uma vasta equipa um novo espaço de informação na RTP 2 – HOJE. Como é que caracteriza este novo espaço de informação?


Um espaço de qualidade informativa em geral, dinâmico na forma e consistente no conteúdo.
É um espaço a dois tempos.
Às 19H00 acompanhamos ainda a vertigem dos acontecimentos. Em 20 minutos temos de resumir o dia, fazer directos, ouvir os protagonistas, mostrar as principais imagens do dia. É um espaço muito dinâmico.
Às 22H00 mastigamos o dia, devagar, saboreando as notícias. É um espaço mais analítico, explicativo, em que ouvimos os comentadores, analistas, onde temos reportagens mais longas, onde vamos até aos 13 locais onde a RTP tem correspondentes para ter um olhar português sobre a realidade desses países.
Onde temos com regularidade algumas das vozes mais respeitadas do país.


9) Quer nos falar um pouco da sua rotina diária, quando está apresentar o programa.


A lócura!!! (Risos).
Levanto-me cedo para dar papa ao meu filho, para vesti-lo e brincar com ele. Tem 17 meses e necessidade de apoio e muita atenção. A mãe trata dele à noite e eu de manhã. Vejo sempre cerca de uma hora de canal Panda, um Pocoyo ou outro e outra bonecada. Quando a ama dele chega, despacho-me a correr – vejo as noticias na TV - e venho para a RTP, onde entro cerca das 10.30, 11 da manhã.
Leio jornais e preparo a reunião de informação diária às 12H15. Almoço a correr para poder ler os jornais com mais detalhe e começar a preparar a entrevista da noite. É sempre sobre um tema diferente, com especialistas e vozes respeitadas na área em questão, e por isso não se pode facilitar.
Apresento às 19 e 22H00, e pelo meio como uma sandes e um sumo.
Quando acaba a edição, cerca das 22H40, ainda ficou até às 23H30, meia-noite, para despachar assuntos em atraso. Sou subdirector, pivô e coordenador do HOJE e não posso, nem devo, descurar nenhum dos aspectos. Chego a casa muitas vezes cerca da uma da manhã. São no mínimo 12 horas por dia, mas não me queixo. Adoro o que faço, faço-o de forma voluntária e com gosto.
Mas a melhor parte do dia é quando estou outra vez com o meu filho, a vê-lo dormir e com ar tranquilo. E lhe digo que é a coisa que mais amo nesta vida. Desde que ele nasceu que passei a ter mais uma preocupação: não fazer nada de que ele um dia se possa envergonhar. Acho que até agora consegui (risos).


10) Como é trabalhar com a jornalista Cecília Carmo?


É óptimo. É uma excelente pessoa, calma, tranquila, bem disposta. Qualquer pessoa da RTP lhe dirá que isto é verdade.
É muito experiente na área da apresentação e trocamos muitas ideias. Ela deu-me conselhos muito úteis no início. Agora manda em mim (risos). ÀS vezes tenho de a lembrar que eu é que sou o subdirector, mas ela não me liga nenhuma (risos).


11) Quem seria a personalidade que ainda não entrevistou mas sempre manteve aquela convicção de um dia a poder entrevistar? Porquê?


Nelson Mandela. É a única personalidade mundial, além do Xanana, que gostava de abraçar e poder dizer-lhe o quanto o admiro. Infelizmente está muito doente e nunca poderei fazê-lo.
Delicio-me com a história do António Mateus – autor recente de um livro sobre Mandela – que privou com ele.
Também gostava de entrevistar a minha mãe, é uma mulher admirável, de uma coragem sem limites. Uma inspiração diária. Mas os manuais desaconselham tal actividade. É pena.


12) Onde se sente mais confortável, como pivô da informação ou em reportagem?
No jornalismo em geral.

Já fiz de tudo na profissão – até já me armei em realizador – e gosto de tudo.
O que mais gostei até hoje foi participar em operações especiais, mesmo quando coordenei e não apresentei nem fiz reportagem ou directos. E fiz centenas, desde cimeiras a visitas de estado, campeonatos do mundo e da Europa de futebol, o Dacar, sismos, uma guerra, eu sei lá…
A minha mulher diz que nunca vou deixar isto até morrer porque não vou ser capaz de largar o jornalismo. Eu ainda acredito que me vou converter à agricultura e ao turismo rural um dia destes (risos).

13) Falemos um pouco das suas reportagens. Gostaria que enumerasse os países onde já esteve em reportagem e quais foram as situações mais caricatas pelas quais passou.
Ui!!! Tem uma semana? (Risos)
Já estive em mais de 30 países e nas mais diversas situações. As mais marcantes foram a Bósnia e o Sismo de L’Aquila, em Itália. Em 6 dias houve 12 sismos de média e forte intensidade. É uma experiência impressionante.
Também me marcou o dia em que morreu um adepto do Sporting no Estádio Nacional. Parece que ainda estou a ver o very-light espetado no peito, o jacto de sangue, o pânico e o desespero dos amigos e vizinhos de bancada. Do pior que vi até hoje. Eu estava na bancada presidencial doJamor, ao lado de António Guterres e Jorge Sampaio. A TSF acabou por dar em primeira mão a morte do adepto porque eu consegui apanhar uma conversa entre assessores do Primeiro-ministro e do Presidente que estavam em pânico com a situação. Só dei o nome e o local de residência depois de ter a certeza de que a família estava avisada. Mas confesso que pressionei ao máximo para que fosse rápido. Havia milhares de adeptos do Sporting no Estádio Nacional, imagine a quantidade de pessoas pelo país preocupadas com a incerteza da identidade – familiares, amigos, conhecidos…
Também dei a morte do Ayrton Senna em primeira mão. Nunca mais me esqueço, foi no dia 1 de Maio, feriado, de 1994. A TSF era a única rádio em directo naquele momento e com noticiários à meia hora, eu chamo o correspondente Henrique Cardão e ele confirma a notícia acabada de chegar, creio que pela Reuters. Foi uma situação que me marcou muito. Eu era um fã do Senna, tinha 25 anos e ele 34. Estava a dar a notícia e a fazer um esforço enorme para não me deixar dominar pela emoção. Tinha isso gravado, um dia destes ponho no facebook.
Há também vários campeonatos da Europa e do Mundo em Futebol, o Dacar, cimeiras, visitas de estado, campanhas eleitorais, congressos partidários, e por aí fora. Em 21 anos, na Rádio Nova Antena, Rádio Orbital, TSF, CNL, SIC e RTP, veja bem o que era possível contar-lhe.
Uma das mais caricatas foi durante a Volta a Portugal em Bicicleta. Um dos repórteres de rádio da velha guarda estava o meu lado em directo na chegada a Lisboa, e estava previsto que os ciclistas passassem duas vezes pela meta, uma vez num sentido e depois no outro. Ele quando ouve o som ensurdecedor da caravana, pensa que já era a chegada definitiva, e pede que o chamem. Eu vejo-o muito agitado porque nunca mais o chamavam, e quando finalmente passam a emissão para lá ele está a olhar para o lado em que os ciclistas iam chegar à meta apenas no final da etapa. Mas a caravana – já estava previsto – começa a chegar pelo lado contrário. Ele não sabe. E começa (não tenho a certeza que o diálogo seja EXACTAMENTE ASSIM):
- Há uma mota da GNR, em sentido contrário. Meu Deus, mas isto é um perigo. Olha, outra mota da GNR em sentido contrário. E agora o carro do oficial. Está tudo doido!!! (Com aquela voz espectacular de radialista)
E continua aos gritos:
- E agora, claro, os ciclistas foram enganados e estão a chegar à meta ao contrário.
Até que um colega, que também está ao lado dele, lhe diz:
- Ó …. Estás a olhar para o lado contrário. O percurso é mesmo por aqui, só daqui a pouco é que voltam neste sentido.
Foi de rir à gargalhada.
Noutra ocasião, o mesmo colega distraiu-se e quando estava a descrever a chegada dos ciclistas caiu num buraco entre o meu plateau e o dele no camião destinado à comunicação social.
Mas não se magoou nem se calou. Ficou com um cotovelo de cada lado, o microfone numa das mãos, o corpo gordinho e pequenino a balançar em suspenso no vazio e lá continuou a fazer a descrição da chegada como se nada se tivesse passado. A imagem era ridícula. Eu tive de passar ao Carlos Marta – ex-ciclista e comentador da TSF que estava em estúdio – e não conseguia parar de rir. Deus castigou-me. No dia a seguir fui eu que caí no buraco, mas não estava em directo, e magoei-me num braço.
Há também a imensa confusão que as pessoas fazem entre mim e o Hélder Reis da Praça da Alegria na RTP 1. No Mundial da Alemanha, em 2006, os emigrantes passavam a vida a pedir-me para tirar fotografias, autógrafos e celebrizaram uma das palavras de ordem nesse Mundial: “Ó Xôr Hélder, gosto muito do seu programa!!!” O Nuno Luz dizia isto várias vezes ao dia e punha toda a gente a rir à gargalhada. Aida hoje há pessoas que quando me cumprimentam dizem: “Olha o xôr Hélder!!!” (risos)

14) A RTP continua a apostar numa informação de qualidade. Quais acham ser as principais características que distinguem a informação da Televisão Públicas das demais Generalistas?


A principal característica é isso mesmo, informação de qualidade. Bons jornalistas, boa liderança, não facilitar nos procedimentos, questionarmo-nos permanentemente se estamos a enveredar pelo caminho certo, não termos certezas absolutas – porque é meio caminho para o desastre – e assumir com humildade que estamos a aprender todos os dias e é sempre possível fazer ainda melhor. Dá muito trabalho, mas dá muito gozo. A informação da RTP é líder, e não é por acaso. É devido a uma excelente equipa, muito grande, na televisão mais antiga do país.


15) Para terminar que conselhos, alusões gostaria de deixar aos futuros jornalistas deste país…


Isto não é vida para ninguém!!! E só nos filmes é que os jornalistas não fazem nada o tempo todo, andam em almoços e jantares e têm muitas miúdas e descapotáveis. (risos)
A sério. Acho que o jornalismo corre sérios perigos em Portugal. Quem quiser vir tem de vir com espírito de missão e paciência para comprar algumas guerras a favor do rigor, da ética e da deontologia. Caso contrário é melhor escolherem outra coisa.

domingo, 5 de dezembro de 2010

À CONVERSA COM RICARDO PINTO - ENTREVISTA A CARLOS ENES, JORNALISTA DA TVI

CONTINUANDO NAS MINHAS ENTREVISTAS DESTA VEZ ESTIVE À CONVERSA COM O JORNALISTA DA TVI, CARLOS ENES.

1) Carlos com que idade e em que circunstâncias surge a sua ligação ao jornalismo?

Como foi a minha avó Branca quem me ensinou a ler - e a jogar às cartas – publiquei o meu primeiro texto aos 5 anos, antes de entrar para a escola, no jornal da Biblioteca Infantil e Juvenil de Viana do Castelo. Mais tarde, fiz um jornal na associação de estudantes do “liceu”. E por volta dos 13 anos comecei a fazer rádio, na Rádio Alto Minho, que funcionava num quartel de bombeiros. Aí, aprendi muito e fiz de tudo, até relatos de futebol.

2) Sempre se viu como um futuro jornalista? Que motivações o trouxeram para esta área?

Sempre, sempre, não. A Irmã Bernardete, minha professora primária, a melhor professora primária do Mundo, adivinhou primeiro do que eu. Julgo que defini a vocação no ciclo preparatório, com a minha professora de Português, que se chamava Gabriela. No ensino secundário para mim já era claro que queria ser jornalista. O gosto pela escrita e pela política, no sentido mais amplo do termo, foram decisivos. A absoluta falta de talento para outras coisas, como jogar à bola, também.

3) Onde é que se licenciou?

Na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, da Universidade Nova, em Lisboa. Vão mudá-la de sítio. É uma pena, porque aquela esplanada da avenida de Berna era muito importante para a nossa “formação”.

4) Onde é que inicia a sua vida ligada ao jornalismo?

Na estação de Santa Apolónia, numa sexta-feira. Entrei no comboio Intercidades e conheci o Pedro Loureiro, fotógrafo de O Independente. A culpa é dele. Eu ainda estava no terceiro ano de faculdade e acabei por ter a minha oportunidade no jornal, um ano depois - e de dezenas de telefonemas a massacrar o Franco Caruso, editor que me abriu a porta.

5) Em que ano e circunstâncias ocorre a sua vinda para a Televisão Independente?

Ao fim de cinco anos de “O Independente” achei que tinha de mudar. Estive com um pé noutros jornais mas o José Eduardo Moniz, que não conhecia de parte nenhuma, convidou-me para “dar notícias” na TVI. Deu-me a volta, porque eu tinha a mania de que não gostava de televisão.

6) Actualmente o Carlos está ligado a um jornalismo fortemente vincado pela investigação. Como é que um jornalista parte em busca do exclusivo?

Para conseguir entrar em “O Independente” eduquei-me para isso. Quando cheguei à redacção já tinha uma “estória” própria. E depois outra, e outra. Só assim foi possível agarrar a oportunidade. Portanto, o primeiro ponto é a atitude. Os jornalistas existem para informar. Revelar o que de interesse público está escondido ou mal contado parece-me mais importante e estimulante do que andarmos a repetirmo-nos uns aos outros, ou a fazer de “pés de microfone”, sem qualquer espírito crítico ou cultura para distinguirmos a verdade da mentira, a informação da propaganda. Depois, para conseguir o exclusivo o jornalista tem de estudar, de ler muito, para compreender o que anda a passar-se à sua volta e o que ele próprio anda a fazer. Finalmente, precisa de uma agenda de contactos e de estar aberto a falar sempre com muita gente.

7) Qual foi a situação mais caricata, quiçá, mais arriscada pela qual passou, enquanto jornalista?

Nunca fiz jornalismo de guerra. Não tenho riscos sérios para contar.
Quanto ao caricato, um dia estive quase a levar uma carga de pancada num relato de hóquei em patins. A Juventude de Viana tinha uma equipa fabulosa, creio que deu 8 ou 9, mas nós não pudemos cantar os golos, caso contrário apanhávamos dos adeptos locais.
Ameaças anónimas já recebi algumas, mas sinceramente não ligo. Às vezes uns senhores mais incomodados com as perguntas ameaçam-me com processos judiciais, mas aprendi a respeitar os tribunais, que não comem jornalistas ao pequeno-almoço. Digo sempre: “faz favor, não deixe de exercer os seus direitos, mas já agora esclareça lá esta questão”. Os últimos a ameaçarem-me, com um estrondoso processo de levantamento do sigilo profissional, foram uns deputados do PS no parlamento, aquele Ricardo Rodrigues dos gravadores à cabeça. Como é óbvio, era só foguetório político: nunca meteram processo nenhum. Como vês, nunca fui seriamente ameaçado.

8) Que reportagem mais o marcou enquanto denunciadora social de uma determinada situação? Livro de reclamações…

Não consigo escolher… Nos tempos de “O Independente”, o relatório dos 500 medicamentos ineficazes, ou mesmo perniciosos, alegremente comparticipados pelo Estado. Ou as contas que andei a fazer à mão, hospital a hospital, serviço a serviço, sobre a baixíssima produtividade da maioria dos cirurgiões. Mais recentemente, a vergonha da Oftalmologia em Portugal. Ou a total irresponsabilidade da nossa política de prevenção de sismos, que vai matar muitas dezenas de milhar de pessoas em Lisboa, no Algarve e no Alentejo litoral. Sobre corrupção, não dá para escolher. Mas vivo indignado com a ladroagem de fato e gravata que nos roubou a todos – e à próxima geração - e que ainda anda por aí a dar lições de moral e de jornalismo.

9) Vê-se como pivô da informação ou o que o fascina mesmo é a reportagem?

Não. A oportunidade de entrevistar ou conduzir debates em directo, pontualmente, podia atrair-me. Mas ser “pivot” não me atrai nada.

10) Como é que surgiu o blogue Fragmentos de Apocalipse. O Petra continua a ser uma musa inspiradora?

Já quase não pratico. Mas achei, num determinado momento, que devia entrar na “blogosfera” por três razões. Curiosidade, por me permitir fazer análise e opinião – o que não tem interesse para o grande público da televisão - e para conquistar outro tipo de fontes. Quanto ao Petra, tem o blog dele. Convidei-o para escrever no meu, mas ele baldou-se. Há uns dias disse-me que anda a farejar formas de manifestação cívica mais eficazes. Nem o Sporting melhorou com a indignação dele e isso fez o cão descrer nas potencialidades das tecnologias de informação.

11) Carlos, na sua perspectiva o que fez acabar o jornal Nacional de Sexta? Motivações políticas, linhas editoriais?

Políticas.

12) O desfecho do Caso Freeport foi o correcto ou o politicamente possível?

Ainda está em curso, por isso vou responder-te genericamente. O desfecho de todos estes “casos” – Freeport, Portucale, Submarinos, Furacão, Universidade Independente, etc. – é o resultado de dois fenómenos muito portugueses: leis penais e processuais que tornam quase impossível perseguir e punir a criminalidade financeira; e o controlo político das cúpulas da Justiça e dos organismos de polícia criminal.

13) Enquanto repórter quais foram os países por onde passou? Que situações o marcaram mais?

Que me lembre: Cuba, Índia, República Checa, Inglaterra, França, Espanha, Marrocos… O Hospital Prazad, na Índia, marcou-me bastante. Como é possível ter a melhor investigação científica e assistência oftalmológica do Mundo – sem listas de espera! – num país tão pobre? O povo cubano também é muito especial, mas já o conhecia das minhas viagens.


14)
A Manuela Moura Guedes sempre se marcou pela irreverência, independência. Como é que foi trabalhar ao lado da pivô?
Foi uma trabalheira, mas foi óptimo. Eu adoro a Manela. É a mais independente de todos os chefes que conheci e há muito poucos jornalistas como ela.



15) No passado dia 5 de Novembro em entrevista a Bruno Nogueira, RTP 1, Manuela Moura Guedes dizer que a actual informação da TVI “é uma porcaria”. O que lhe apraz dizer acerca deste comentário, de alguém que já esteve à frente da direcção de informação da Televisão Independente?

Sobre a TVI falo internamente. À Manela telefono-lhe, não bato bolas em público. Mas aproveito a pergunta para te dizer que perfilho uma visão muito crítica do actual jornalismo. Se o jornalismo não contou, antes das eleições, o país que se revelou logo a seguir, não achas que falhou? Eu acho que sim e até me parece estranho que ninguém se preocupe com isso e que o público não nos atire à cara que o enganámos.

16) Para terminar, que mensagem gostaria de deixar aos futuros jornalistas deste país?

Pensem.

domingo, 28 de novembro de 2010

À CONVERSA COM RICARDO PINTO: ENTREVISTA EXCLUSIVA AO JORNALISTA JOSÉ MANUEL FERNANDES.

CONTINUANDO NAS MINHAS ENTREVISTAS...

1) José Manuel Fernandes com que idade e em que circunstâncias surge a sua ligação ao jornalismo?
Surge em 1976, com 19 anos. Tinha de começar a trabalhar (já estava casado) e surgiu uma oportunidade num jornal. Aproveitei e, depois, nunca mais larguei.

2) Em 1976 matriculou-se em Medicina, que logo trocaria pela Biologia, na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa. Que aventura foi esta? Perdeu-se um grande médico, ganhou-se um grande jornalista!?
Matriculei-me em Medicina ainda em 1975, mas nem completei um semestre. Senti que não tinha vocação. Quando voltei a estudar, após um atribulado processo de transferência, escolhi Biologia. De certa forma, era o que sempre tinha querido estudar.

3) Se não fosse jornalista o que se via a fazer, profissionalmente?
Quando optei por Biologia pensava vir a ser investigador. Sempre me fascinou a descoberta científica.

4) Onde é que se licenciou em jornalismo?
Nunca me licenciei em jornalismo. Quando estudei nem sequer havia licenciaturas em comunicação social.

5) Cada vez mais se fala do jornalismo enquanto um 4.º Poder que funciona em simultâneo como contra-poder. Acha que o jornalismo deve assumir essa mesma função?
Acho que o jornalismo deve funcionar como um contra-peso que limita o poder executivo ao permitir que os cidadãos estejam informados, questionem as políticas e pensem pelas suas cabeças. Tem também uma função de vigilância democrática, de "watchdog". Não acho que deva assumir-se como um poder autónomo.

6) Como é que vê a evolução do jornalismo sobretudo ao longo das últimas décadas em Portugal?
A evolução do jornalismo em Portugal no pós-25 de Abril foi muito positiva e teve, porventura, o seu melhor período durante a década de 1990. Nos últimos anos tem sofrido muito com a crise económica e a redução do tamanho das redacções.

7) A informação isenta e objectiva são características pelas quais o bom jornalismo deve primar, no entanto não considera que «por mais que se procure esse distanciamento, a personalidade do jornalista, o seu pensamento» acabam muitas vezes por demarcar determinadas posições?
Sem dúvida. O jornalista deve procurar ser isento tendo a noção de que, como qualquer ser humano, o seu olhar é necessariamente subjectivo. É melhor assumir que há sempre subjectividade do que fingir que se é imaculadamente puro, pois essa condição não existe.

8) A relação entre o político e o jornalista são vincadas de um misto de ambivalências. O político precisa do jornalista para transmitir as suas ideias, opiniões e o jornalista precisa dele para informar o cidadão. Não obstante quando o jornalista entra em campos de investigação com os quais o político não concorda gerasse muitas vezes um clima de tensão. Como é que vê na actualidade esta relação?
Não acho que a tensão actual seja muito diferente do que foi no passado e será no futuro. O político procura e procurará sempre formatar a informação de acordo com as suas conveniências, os jornalistas devem procurar toda a informação relevante para os cidadãos. Estes dois conjuntos nem sempre coincidem, pelo que é positivo estar consciente dessa tensão.

9) O José Manuel tem vindo a participar ultimamente em debates televisivos. A questão que lhe coloco é: não será para um jornalista muito mais difícil assumir o lado de «entrevistado» do que entrevistador, uma vez que a partir daí entramos no domínio da opinião subjectiva?
Quando participo em debates e quando dou opinião faço-o enquanto cidadão informado que tem a profissão de jornalista. Ou, se preferir, enquanto jornalista de opinião, que é um domínio da actividade que tem também toda a legitimidade.

10) Como é que vê o Jornal Público na actualidade?
Como o jornal onde trabalhei 20 anos e onde hoje continuo a colaborar.

11) Qual é a sua opinião relativamente ao final do Jornal Nacional de 6, apresentado por Manuela Moura Guedes. Acredita na tese que o poder político acabou por extingui-lo?
Não é preciso concordar com o que se faz num órgão de informação para defender que, em nome do pluralismo, ele deve existir desde que tenha público. O Jornal Nacional de 6 tinha público (registava boas audiências), pelo que não foi por desinteresse dos telespectadores que acabou. De resto não tenho qualquer dúvida que as pressões do poder político não se limitaram a um ataque do José Sócrates na abertura de um congresso do PS: foram mais profundas, mais dissimuladas e, por fim, mais efectivas.

12) Falou-se aqui há tempos atrás do programa «Prós e contras» em que participou e o tema estava relacionado com o processo Casa Pia, onde aliás, Carlos Cruz esteve presente. Agradou-lhe a forma como o programa foi conduzido, é que a determinado momento, à maioria do público a ideia que se passou era que a grande vítima ali presente, era Carlos Cruz!?
Não gostei nada da forma como o programa foi conduzido. Mesmo nada. Tentei contrariar alguma coisa, mas era difícil.

13) Cada vez mais se fala que é inevitável a vinda do FMI a Portugal. Acredita que essa seria uma boa solução para actual conjuntura do país?
Portugal vai ter de fazer muito mais reformas do que as que já estão em curso. Se não as conseguirmos fazer sozinhos - e não estamos a conseguir -, que venha o FMI o mais depressa possível.

14) Como é que reagiu à entrevista ao jornal francês Liberation de Dezembro de 2007 de José Sócrates, onde este o classificou como sendo o seu "melhor inimigo"?
Como sendo um sinal da obsessão que Sócrates tem com a sua imagem e da forma como lida mal com a crítica e, sobretudo, com a liberdade de imprensa. Achei que revelava uma mentalidade doentia.

15) Acredita que o seu poder reivindicativo oriundo desde os tempos MAEESL - Movimento Associativo dos Estudantes do Ensino Secundário de Lisboa ou do primeiro secretariado da União de Estudantes Comunistas (Marxista-Leninista) possa ter marcado definidamente as suas ideologias políticas, marcando profundamente o seu tipo de jornalismo interventivo?
Não tenho dúvida que a minha experiência de vida, nomeadamente nesses anos, marcou muito o que sou. Nunca fui conformista, sempre corri alguns riscos, nunca gostei de ser um "yes men" e sempre procurei pensar pela minha cabeça. Para além disso nunca fui indiferente ao destino da sociedade, pelo que ser interventivo é, para mim, a forma mais natural de estar na vida.

16) Para terminar, qual acredita ser a situação política deste país. Novas eleições em 2011?
Muito provavelmente. E era melhor que assim fosse: tal como estamos não vamos a lado nenhum. Os agentes políticos necessitam de se relegitimar e o país precisa, depois, de que tenham o sentido de Estado para um acordo a médio prazo.

domingo, 17 de outubro de 2010

Entrevista exclusiva à Jornalista Conceição Queiróz, TVI


Na continuação do projecto lançado por este blogue, publica-se hoje a 4.ª entrevista. Devo dizer que tem sido um privilégio contactar com estes profissionais e com tudo aquilo que eles no ensinam, nas suas vivências, nos seus trabalhos, na sua vida...

Desta vez conversei com a jornalista da TVI, Conceição Queiróz, cuja entrevista poderá ler na íntegra:

(Foto de Ana Lopes Gomes)
1) A Conceição sai aos 12 anos de Moçambique. Que recordações guarda do seu tempo de criança nesse país africano?
Recordo essencialmente o sentido de família. Os almoços de domingo, os cheiros e os aromas da fruta, o camarão tigre, o Natal debaixo de 40 graus, as voltas à Ilha de Moçambique com o meu pai num barco a motor veloz. A vida em África é levada noutro ritmo. Temos todo um tempo que é absolutamente nosso. E isso não tem preço.

2) Sei que os seus pais gostavam que tivesse tirado um curso ligado à saúde, nomeadamente, fisioterapia. O que a levou a enveredar pelo caminho do Jornalismo?
Pois é… Os meus pais queriam muito que eu tivesse seguido medicina ou qualquer outro curso da área da saúde. Poderia ter sido fisioterapia, enfermagem, análises clínicas. Acabei por trilhar os caminhos do jornalismo, influenciada por uma professora de Português que gostava muito de mim, que puxava por mim, incentivava-me, fazia-me compreender uma série de outras coisas pelas quais não me interessava minimamente. Foi o caso do jornalismo. É verdade que cresci a ouvir histórias incríveis que as minhas avós contavam, mas não foi isso, definitivamente, que me levou a este mundo do jornalismo.

(Fotografia de Ana Lopes Gomes)

3) Quais foram as suas primeiras experiências profissionais? Ainda se lembra da sua primeira peça jornalística?
Comecei na imprensa, no Grupo Semanário. O meu primeiro trabalho foi publicado há 16 anos, em 1994. Foi uma entrevista à Campeã Nacional de Karting… Lembro-me perfeitamente.

4) A Conceição já foi professora de português. O que lhe apraz dizer acerca do novo acordo ortográfico nos países de LOP?
O novo acordo ortográfico é aplaudido por uns mas encontra resistência por parte de outros. As mudanças nem sempre são bem aceites mas parece-me razoável que nos habituemos às novas regras. De qualquer maneira, vivemos um momento de transição uma vez que até 2015 podemos manter a grafia que utilizamos hoje. É uma fase de adaptação e o novo conversor de documentos para este novo acordo ortográfico já foi apresentado.

5) Aqui há uns tempos atrás lançou o livro «Serviço de Urgência». Como foi contactar diariamente com pessoas que estavam entre a vida e a morte, pessoas que num dia viu eventualmente sorrir e no outro já não estavam entre nós?
Acompanhava-os a partir do momento em que davam entrada na Urgência do Santa Maria. E quando isso acontecia, as pessoas já não estavam bem. Foi das experiências mais duras e mais envolventes. Estar ali, frente a frente com a fragilidade do ser humano mas também com aquilo que é o limite da ciência. Há coisas que a própria medicina não consegue controlar. E isso desvenda-se claramente sempre que se perde uma vida.



6) A Conceição é uma mulher de andar no terreno, de investigar e a verdade é que muitas vezes deve estar semanas fora do País, no continente africano, por exemplo, com as mínimas condições, a que nós portugueses estamos habituados. Recorrendo um pouco à reportagem que nos apresentou, sobre os «Meninos do Jamba», como foram os seus dias, as suas rotinas, na vivência com estas crianças?
Como não sou um ser humano de rotinas (fujo a essa vivência estática, quase rígida que suporta a maioria dos homens e das mulheres…) adapto-me bem e rapidamente a quaisquer cenários. É no terreno que a minha profissão se concretiza, é ali que tudo ganha sentido, de caras com um outro mundo… Os entrevistados, os factos, a verdade. As crianças eram o centro das atenções na Jamba Mineira. Ouvi-as com atenção, sentei-me no seu chão. Percebi depressa que precisam apenas de uma oportunidade. Tratavam-me por mana, por madrinha, por mamã. Lutei para voltar a Angola e levar os donativos que juntei depois da emissão da reportagem. Os portugueses continuam solidários.

7) Pelo histórico das suas reportagens, denota-se que é uma mulher ligada a causas, aos outros. Sente que de certa forma com as suas reportagens está a ajudar os mais desfavorecidos?
Gosto das pessoas, acima de tudo. Não sei se as minhas reportagens ajudam os mais desfavorecidos mas é preciso mostrar, temos de revelar o que acontece. É bom que as pessoas compreendam de uma vez por todas que o mundo não começa nem acaba nas suas ruas, nas suas pracetas.

8) Ainda há pouco tempo, mais um trabalho seu e de toda a sua equipa premiado, «Música no Coração». O papel da música enquanto instrumento de inclusão social. Como é que nasce num jornalista, no caso, a Conceição, a ideia, a criatividade, de procurar histórias que nos preenchem, enquanto seres humanos? Ao fim e ao cabo como nasceu esta reportagem?

Tudo começa pela ideia, precisamente. Estou atenta ao que se passa… Pego no meu carro, vou aos sítios falar com as pessoas, compreender, tentar descodificar. Mas por vezes, uma breve num jornal também me pode inspirar e então fazes 30, 35 minutos em televisão a partir de uma notícia que passou completamente ao lado da maioria dos leitores. Outras vezes, escrevem-me, telefonam-me, falam-me de situações que merecem um trabalho de fundo. A reportagem “Música no Coração” nasce depois de eu ter visto na RTP 2 uma peça de dois ou três minutos e depois na RTP África com mais algum tempo… E mesmo assim eu achava que se podia fazer mais… Que aquela temática merecia continuar a ser tratada e claro, dando-lhe tempo. Fiz então um trabalho de 40 minutos mas tinha material para uma hora. Contrariando as expectativas acabou por ser a reportagem mais vista do ano de 2009 com picos de 2 milhões de telespectadores. Os miúdos da Orquestra Geração seduziram os portugueses.

9) «A Escola da Vida» foi outra reportagem de mérito, onde a Conceição acompanhou o dia-a-dia de estudantes de mais de 35 nacionalidades. Acha que o racismo, a exclusão social, são problemáticas que têm vindo a diminuir?
Quero acreditar que o racismo diminui. Temos bons exemplos. “A Escola da Vida” prova isso mesmo. Já muita coisa mudou mas é um caminho que estamos a fazer. A exclusão social não… Não me parece que esteja a reduzir. Porque aqui estamos a falar de algo que imediatamente se associa à pobreza, também à falta de poder e de acesso ao mais elementar. E a pobreza aumenta aos olhos de quem quiser ver. Obviamente que a situação de sem-abrigo é o registo extremo da exclusão social mas o desemprego faz com que se percam quase todas as redes sociais, inclusivamente os amigos. A exclusão social pode começar nesse processo de exclusão do mercado de trabalho… E é perigosíssimo.

10) Ainda há poucos dias, esteve num campo de refugiados, no Quénia. Quais são as grandes dificuldades de uma equipa de jornalistas ao entrar num local como este, onde a guerra, a fome, a morte são constantes?
Acho que tudo depende da flexibilidade de espírito, da capacidade de nos adaptarmos. Em relação às dificuldades… Jamais serei indiferente ao sofrimento humano. Onde quer que esteja. No Quénia, naquele campo de refugiados, vi o que nunca imaginara. Crianças enlouquecidas. Não tem explicação… Enlouquecem porque o pai foi esquartejado diante delas, porque a mãe estava grávida e abriram-lhe a barriga a sangue frio. Outros foram mutilados. É isso que custa. O resto dos obstáculos perde sentido para a equipa de reportagem. Falo por mim, naturalmente.

11) Em alguma reportagem que fez ao longo dos mais de 14 anos de experiência sentiu medo, onde, eventualmente, a sua vida pudesse estar em risco?
Nada de grave. Só fui apedrejada uma vez e tentaram atropelar-me ao de leve… Também fui ameaçada para não fazer uma certa reportagem que punha em causa o bom-nome de uma família a que pertencia uma enfermeira que atropelou mortalmente um rapaz de 20 e poucos anos.

12) Quando se trata de reportagem onde os entrevistados apenas falam crioulo, por exemplo, é a própria Conceição a fazer as traduções para o português, ou conta com a ajuda de um tradutor?
Aconteceu-me em Cabo Verde. Algumas pessoas só falavam crioulo. Pedi a um taxista que me dissesse como perguntar o que queria, escrevi exactamente como se pronunciava e fiz as entrevistas, dispensando o tradutor. No interior de Moçambique sucedeu o mesmo. Explicaram-me como pronunciar algumas das palavras, compreendi rapidamente, registei, tirei todas as notas necessárias e comuniquei através da língua local. Correu muitíssimo bem. Mas claro que há situações em que não se pode dispensar o tradutor.

13) Quando se encontra, em países, tão longe de Portugal, como por exemplo o Quénia, a reportagem é editada e pronta para exibição, já em Portugal, ou toda a matéria é enviada do país, onde se encontra no momento?
No Quénia tínhamos actualidade. As coisas estavam a acontecer no campo de refugiados. Eu e o repórter de imagem fomos enviando as peças já feitas, editadas, prontas para emissão, diariamente.

14) Assistimos há alguns meses a uma reportagem sua sobre a cidade de Lisboa, sobre o comércio tradicional, as tradições, as vivências de um povo. Quer nos falar um pouco sobre esta reportagem e sobretudo a sensação que sentiu ao saber, que um dos seus entrevistados, pouco tempo depois da reportagem faleceu?
Foi tão enriquecedora essa reportagem, esse pequeno retrato de uma Lisboa antiga. Passei a gostar ainda mais da capital, eu que já tinha paixão pela cidade. Queria conhecer melhor os que naturalmente resistem à modernidade, os que ainda vendem porta a porta ou faziam compras na drogaria da Rua da Lapa, onde o senhor Fernando (o entrevistado que faleceu) trabalhou durante décadas. Fiquei sem graça nenhuma quando recebi o telefonema do filho a avisar-me que o pai tinha morrido na véspera de Natal. A promoção da reportagem já estava no ar, não sabia o que fazer. O mínimo foi dedicar-lhe a reportagem e ir ao funeral, com missa de corpo presente na Basílica da Estrela. Não me esqueço que pediu muito que o avisasse do dia da emissão da reportagem e que lhe oferecesse um DVD com a cópia do trabalho. Já o fiz. Entregamo-lo ao filho.

15) A distinção do Prémio AMI - Jornalismo Contra a Indiferença, fá-la acreditar que é possível mudar mentalidades, alertar os governantes? Acredita que o facto de ser moçambicana, de cor, contribuiu ao longo de toda a sua vida numa luta mais aguerrida, contra o racismo, por exemplo?
O prémio é sempre a valorização do trabalho de bastidores uma vez que não é fácil fazer uma boa reportagem. Em relação às mentalidades, não é algo que se altere de um dia para o outro. Já os murros no estômago, esses alertas para determinadas realidades que se escondem, são necessários. Quanto ao facto de ser africana… Nunca usei isso como bandeira. As pessoas têm sempre muito mais curiosidade pelo meu trabalho e eu sinto isso mas não me incomoda minimamente. Sou sempre muito bem tratada, muito acarinhada pelo público.

16) Trocaria a vida de repórter por pivô de informação? Porquê?
Não, não troco. Até porque já tive a experiência de estúdio. Na Televisão de Cabo Verde apresentei o Jornal Desportivo e foi óptimo mas eu amo estar no terreno.



(Fotografia de Ana Lopes Gomes)


17) Conceição que tipo de trabalhos poderemos continuar a ver daqui para a frente da sua autoria?
Continuo na equipa da grande reportagem…

18) Para terminar esta entrevista, uma pergunta mais intimista - o seu cabelo, é de facto uma imagem de marca, de reconhecimento. Confesse-nos, que preocupações diárias tem com ele?
O meu cabelo?! Imagem de marca? Para mim é um problema. Uma trabalheira. Ora o original afro, ora um rabo-de-cavalo para não me chatear, ora tranças corridas para acordar penteada. Mas cá nos entendemos.

luso-africa.net

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

PRÓXIMO DOMINGO (17 DE OUTUBRO) - ENTREVISTA EXCLUSIVA A CONCEIÇÃO QUEIRÓZ, JORNALISTA DA TVI

PRÓXIMO DOMINGO - 17 DE OUTUBRO
NO «À CONVERSA COM RICARDO PINTO »- ENTREVISTA EXCLUSIVA A CONCEIÇÃO QUEIROZ.
A reportagem «Música no Coração», da jornalista da TVI Conceição Queiroz, com imagem de João Paulo Delgado e montagem de Miguel Freitas, venceu o Prémio do Diálogo Intercultural ex-aequo com a RTP, atribuído pelo... Alto Comissari...ado para a Imigração e para o Diálogo Intercultural (ACIDI).
Não perca!

domingo, 10 de outubro de 2010

ENTREVISTA EXCLUSIVA A MIGUEL CABRAL, JORNALISTA DA TVI

1) Miguel, com que idade surge o seu gosto pelo jornalismo? Em que moldes?
A paixão inicial foi pela rádio, depois de alguns anos de actividade na área a ligação ao jornalismo foi ganhando terreno até que fiquei rendido ao jornalismo.
2) Lembra-se dos telejornais do seu tempo de adolescência? Quem eram os seus jornalistas de eleição à época, porquê?
Ao longo dos anos 80 comecei a ver os telejornais e na altura recordo-me de fixar mais as histórias do que propriamente pivots.
3) Aos 16 anos começa a fazer rádio. Que tipo de programas fazia à época?
O início da rádio foi com um programa de desportos motorizados na Voz do Marão, mas de imediato integrei a equipa desportiva da rádio.
4) Onde tira a sua formação em jornalismo?
Na universidade frequentei o curso de Educado de Infância. A experiência na área foi fundamental para continuar ligado à comunicação social, através da participação em diversas acções de formação, colóquios e curso práticos.
5) Como é que nasce a sua ligação com a TVI, enquanto repórter?
O convite surgiu numa altura em que na rádio me dedicava por inteiro ao jornalismo, sendo inclusivamente colaborador em alguns jornais.

6) O Miguel ofereceu aos portugueses destinos de eleição, cá no Norte. Sente que, de alguma forma esta região se encontra um pouco esquecida pelo resto do país?
A região transmontana é algo esquecida por quem decide na altura de fazer grandes obras tais como melhores vias de comunicação mas a maioria dos Portugueses sabe que Trás os Montes tem produtos e paisagens únicas no País.

7) Estando tão longe da Mãe (TVI) conte-nos como é um dia do seu trabalho. Suponhamos há um acidente na região de Amarante. Como é que o Miguel é chamado ao local, alguém lhe comunica ou é o próprio Miguel que parte para a notícia, após a consulta de outros órgãos de comunicação social?
Na maioria da vezes são fontes estabelecidas na carreira que permitem chegar cedo aos locais e assim avisar a TVI de determinados acontecimentos.
8) Qual foi a reportagem mais emocionante, aquela que lhe apetecia sair dali devido à sua carga emotiva, eventualmente, morte, destruição…?
Há sempre reportagens que nos marcam, sobretudo aquelas que envolvem a morte de alguém. Recordo viver momentos de aflição num incêndio que no momento ne fez desejar sair do local o mais rápido possível.
9) O repórter costuma viajar muito. Que países já visitou, enquanto jornalista?
Como correspondente numa delegação a saída do País em reportagem não é muito frequente mas já tive oportunidade de estar em alguns locais, tal como a Bósnia com várias reportagens sobre os militares portugueses ali colocados.

10) Como é que analisa a relação entre política e jornalismo nos dias de hoje?
Sempre foram áreas que se tocaram pela importância que as duas têm na sociedade. No jornalismo há que tentar mostrar à opinião pública os factos sempre com rigor.

11) Como é que na sua perspectiva nasce a reportagem exclusiva para um jornalista?
Através de investigação. Área que ainda está por desenvolver pois exige muitas horas de dedicação que por vezes os jornalistas não têm pois existem muitas reportagens a elaborar.
12) Quando o Miguel está de férias, consegue-se desligar da actualidade nacional, ou a sua profissão fala mais alto e tem necessidade de se manter permanentemente actualizado?
É difícil desligar, mas umas férias sabem sempre bem.
13) Como vê a relação entre as novas redes sociais (facebook, twitter) e o jornalismo?
Hoje em dia a maioria das pessoas está ligada a redes sociais e um jornalista deve estar atento à nova realidade que é a possibilidade de partilhar ideias por exemplo sobre reportagens.
14) O que lhe dá mais prazer fazer, escrever a notícia (imprensa escrita), ou fazer o seu pivô para televisão? Porquê?
A reportagem em si é algo que dá gosto fazer pois trata-se de contar uma história ao público através dos meios que nos são facultados.
15) Ainda hoje, depois de alguns anos a fazer directos, sente aquele «friozinho» ao ver a luz da câmara acender?
Curiosamente nunca senti muito esse “friozinho” pois desde sempre, sobretudo na rádio me lembro de fazer directos.
16) O bom jornalista é aquele que cresce todos os dias. Que conselhos gostaria de deixar aos futuros jornalistas deste país?
Sem dúvida, todos os dias se aprende algo com alguém, e muitas vezes é em locais quase isolados mas com pessoas com história de vida impressionantes. Quem gostar de jornalismo deve emprenhar-se ao máximo para ter futuro na área que é realmente cativante.


SPORTING - O CLUBE DO CORAÇÃO DO JORNALISTA

ENTREVISTA DADA PELO JORNALISTA À UTAD

domingo, 26 de setembro de 2010

ENTREVISTA EXCLUSIVA A RITA MARRAFA DE CARVALHO - JORNALISTA DA RTP

1) Rita como é que nasce esta paixão pelo jornalismo? Era também daquelas crianças que se punha em frente ao espelho a apresentar o telejornal?
Não, de todo. A apresentação de um espaço informativo nunca foi factor de fascínio. Achava limitativo. Interessava-me o terreno, o contar a história, o estar nos locais e interagir com os intervenientes. Comecei na Rádio e Televisão Escolar, no Liceu. Um simples Clube de Comunicação Social que acendeu um rastilho intenso... uma vontade de contar as histórias reais. A partir daí, quis experimentar tudo o que me apareceu na área da comunicação: rádio local, imprensa escrita, até produção de cinema. Depois, naturalmente, seguiu-se o curso de Ciências da Comunicação, na Universidade Nova de Lisboa. A necessidade de saber como contar, modos de contar, de intervir, de dominar os modelos comunicacionais.



(Foto de Garriapa - jornalista da SIC)

2) Há quantos anos está nesta profissão e qual foi o local da sua rampa de lançamento?
Eu comecei a fazer rádio na SeixalFM com 17 anos. Depois, foi em crescendo. Já lá vão 16 anos.


3) Voltaria a fazer tudo da mesma forma?
Julgo que sim. Não há nenhum passo de que me arrependa. Aprendi sempre algo. Mesmo quando a experiência foi menos gratificante ou prazeirosa, tirei sempre lições.






4) A Rita para além da sua faceta de jornalista dedica-se também à escrita. Em 2006 surge juntamente com Eduardo Águaboa no romance, Vieste p@ra ser o meu livro. Acredita que numa sociedade cada vez mais globalizada, se perderam os velhos hábitos de socialização face-a-face, ou o espaço «dos bites e bytes» serviu para aumentar esses elos de ligação entre as pessoas?
Esse, curiosamente, é o tema da minha tese de Mestrado, ainda em construção... Sem dúvida que a “tecnologização” das relações criou novos conceitos de interacção. Se são passíveis de qualificação como bons ou maus, é discutível. A informação dialogante está acelerada, rápida, imediata. Mas isso é sinal de que está melhor? Não, não creio. A parede tecnológica, que é algo que intermedeia uma relação comunicativa, como um computador, um telefone ou os SMS's, intensifica a intimidade. Mas essa mesma intimidade não deixa espaço para toda a paralinguagem. Não existe o cheiro, as inflexões da voz, ou as expressões do olhar. Toda a linguagem corporal e facial perde-se. Por isso, sim... acho que os hábitos de socialização estão inegavelmente diferentes. Potenciam o contacto mas isso não significa que melhorem o contacto.




5) Já em 2008 juntamente com a jornalista Margarida Neves de Sousa surge como autora de uma obra mais jornalística, de investigação – Esmeralda ou Ana Filipa. Como é que uma jornalista consegue gerar emoções tão fortes neste caso concreto, onde ambas as partes revelavam querer o melhor para a menina, quererem a guarda definitiva de Ana Filipa no caso da Família Gomes ou de Esmeralda no caso do pai biológico, Baltasar Nunes?
Essa obra foi tremendamente trabalhosa. Aquilo a que se chama “uma verdadeira dor de cabeça”. Lemos milhares de artigos publicados, vimos horas de reportagens dos três canais, uma carga inexplicável de informação divulgada pelos media. Não nos é permitido, obviamente, adoptar posições mas revelar factos. E, neste caso em concreto, muitos dados não eram claros, não tinham sido divulgados correctamente ou com exactidão. E era inegável o interesse social e criminal do caso. Subitamente, era a novela da Esmeralda a que as pessoas assistiam todos os dias nos noticiários. Mas era de uma criança que se tratava... disputada por três famílias, a certa altura. Os meios de comunicação foram os culpados de verdadeiras barbaridades... fotografar a criança no primeiro dia de escola, filmá-la a gritar dentro do carro na passagem para o pai biológico. São momentos que, esperemos, sirvam para reflectirmos e não repetir.

6) A Rita é uma grande defensora da preservação da Língua, enquanto identidade Portuguesa. O que lhe apraz dizer sobre o acordo ortográfico?
Essa questão é curiosíssima porque assumi essa posição num espaço cibernáutico como o Facebook. Curiosamente, as pessoas mais directamente ligadas ao uso da língua portuguesa não foram perdidas nem achadas neste Acordo. Não, de facto, não concordo com os preceitos, os métodos e imposições. Não é uma questão de se preservar a rigidez da língua, mas de permitir a sua riqueza inter-continental. Não temos de falar todos da mesma maneira, não temos de uniformizar fórmulas! Os Ingleses dizem e escrevem garbage, os americanos trash. Os ingleses escrevem want to, os americanos utilizam com mais frequência o wanna. E então? São estas preciosidades que os tornam únicos.

7) Recorda-se ainda hoje do seu 1.º directo? Onde foi, que reportagem e que sentimentos a rodearam naquele momento?
Recordo-me do meu primeiro directo de televisão, sim. Mas não me recordo do de rádio, o que não deixa de ser curioso. O meu primeiro live em televisão nem foi como jornalista, mas como apresentadora do Curto Circuito Especial de fim-de-semana, no já extinto CNL. O Rui Unas e a Rita Mendes apresentavam de 2ª a 6ª e eu aos Sábados, com um painel de convidados, três horas em directo, sem teleponto. Maravilhoso. Correu muito bem. Na RTP, como jornalista, foi na estação rodoviária do Colégio Militar por uma greve qualquer. Estávamos em 2000.Quem me conhece sabe que não sou de grandes nervos ou inseguranças. Quando apresentei o Curto Circuito estava, inevitavelmente, tensa. Mas foi algo que ultrapassei nos primeiros minutos, quando ouvi no auricular “estás no ar”. Talvez por isso, o directo na RTP tenha sido feito com alguma tranquilidade. Não era novidade olhar para uma câmara, ouvir o “fala” no ouvido... Gosto muito do sem-rede, do é agora. É um pôr-me à prova de que gosto bastante e que confere uma adrenalina notável. E tenho um péssimo hábito: não escrevo nada, não faço anotações, não decoro discursos. Se por um lado é bom, - não fico agarrada a um fio que se pode perder ou sem capacidade de respostas face ao imprevisto,- por outro, se me esquecer de um nome ou de um número... Talvez por isso, goste da efemeridade do directo, do teste “tenho de dar o máximo de informação com clareza e veracidade”. A minha estratégia é simples: se tenho de partilhar uma informação com o telespectador, faço-o como se contasse algo a alguém familiar, num estilo informal mas incisivo e com as devidas distâncias discursivas, como se de um diálogo se tratasse em lugar de um discurso empinado.

8) Sente que a vida de jornalista na actualidade é difícil, pela sua precariedade, pela sua remuneração?
Não tenho a menor dúvida que estamos a passar por uma das piores fases do mercado jornalístico. Não há empregos. Não há lugar para as “fornadas” de jornalistas que saem das universidades, politécnicos, escolas profissionais. Muitas com um ensino duvidoso e programas desprovidos de qualquer sentido prático do ofício. Mas hoje, atenção, os jornalistas são mais bem pagos do que eram há uns anos valentes. Quando surgiram as televisões privadas, e mesmo antes, com os jornais de vanguarda, que foram uma autêntica pedrada no charco, como o Público e o Independente, os salários sofreram visíveis aumentos. Actualmente, vivemos um período negro... os estagiários não são remunerados, a progressão de carreira é lenta ou inexistente, e os salários não conhecem aumentos há muito tempo. Os jornalistas são dos licenciados mais mal pagos no início de carreira. Algo que me entristece muitíssimo. Há um congelamento de expectativas, de evolução. É difícil crescerem e surgirem novos nomes porque, constantemente, há areia na engrenagem...

9) O que a mais gratifica na sua profissão?
A intensa e permanente aprendizagem e o modo como mudamos a vida das pessoas. Que influências intensificamos, as convicções que se alteram, outras realidades que revelamos... e aquelas que nos são reveladas a nós próprios. Guardo as mais preciosas histórias e o prazer de ter privado com os mais ilustres anónimos que partilharam comigo experiências de vida riquíssimas. Essa é a grande virtude: aprender, experimentar, conhecer. É uma fonte inesgotável para uma sede de conhecimento que tenho.



Banda Aceh, Samatra, Indonésia, 2005
Tsunami no Sudeste Asiático

10) Grande reportagem ou pivô da informação? Porquê?
Não há qualquer dúvida quanto a isso... Grande reportagem sempre. Eu recordo que nem sempre tivemos pivôs jornalistas. Os pivôs eram apresentadores. Por isso, homens com um poder comunicacional brilhante, boa imagem e cultura-geral, eram pivôs. O Fialho Gouveia e o Carlos Cruz foram pivôs de informação, por exemplo. Hoje em dia isso já não acontece. Mas, mesmo assim, tenho a convicção de que a índole do repórter está no terreno, no campo, no toque e na vivência. Jamais teria espírito para ficar encerrada num estúdio, alterando pivôs propostos pelos jornalistas que executaram as reportagens... e são nessas que eu gosto de estar. São essas que eu gosto de fazer.

11) Considera que os media causam alguma influência na sociedade portuguesa? Em que sentido?
Não podemos ser ingénuos e considerar que os media têm um papel suave e superficial. Não, de todo. Eu recordo-me de um documentário feito na SIC para o canal Arte, por Mariana Otero... em Cette télévision est la vôtre, Emídio Rangel dizia, numa reunião , algo do género... que vendiam presidentes como vendiam sabonetes. E não está muito longe da verdade. Existem interferências mais ingénuas no que diz respeito a influência dos media, como um produto óbvio da máquina mediática que é o happening. A presença de comunicação social é produtora de happenings... uma manifestação com 5 ou 6 pessoas calmas e ordeiras, transfigura-se com uma ou duas máquinas de filmar. As pessoas gritam mais alto, têm posturas mais assertivas. Tudo isto é plausível. Depois temos as convicções transformadas em modelações da realidade. Essas são as evitáveis...




12) A Rita foi uma das jornalistas a fazer a cobertura no terreno na leitura da súmula do acórdão do Processo Casa Pia, no passado dia 3 de Setembro. Todos nós, público, vimos a observação que Carlos Cruz lhe fez nesse dia, aquando da sua intervenção sobre o arguido, dizendo que este revelava um passo apressado na sua entrada. Acha que nestas situações tão delicadas, muitas vezes os jornalistas são de certa forma inferiorizados, bodes expiatórios, que resulta na revolta dos arguidos?
Carlos Cruz não estava numa posição fácil e eu também não. Não é comparável ouvir uma sentença ao final de 5 anos e 10 meses de julgamento e estar em directo numa maratona. Não tenho a menor dúvida, mas eram momentos tensos para ambos e ele respondeu com alguma tensão defensiva. Percebo lindamente. Se existiam outros modos e fórmulas para responder e escoar essa tensão? Sim, claro que havia.
Os jornalistas são incómodos para quem não quer responder! São chatos para quem está constantemente a ser assediado por jornalistas, são inconvenientes quando as questões são postas recorrentemente... tudo é relativo. Depende de que lado se está. O meu trabalho é informar. Tentar, legitimamente, obter informação. Se tenho de ser chata? Às vezes. Compensa? A maior parte das vezes sim... É ingrato? Não tenho a menor dúvida.

13) Como é que vê a relação entre a política e o jornalismo na sociedade contemporânea?
Vejo com a singularidade normal das relações entre jornalismo e restantes editoriais e temas. A relação foi, noutra altura, mais promíscua. Talvez mais tácita. Hoje é algo mais distante, mais respeitoso. Os terrenos estão mais delimitados. E ainda bem.

14) Nos últimos tempos tem-se falado bastante no código deontológico do jornalista. Haverá alguma situação em que este possa ser violado, ou pelo menos deixado um pouco de parte, quando se quer passar a verdadeira informação ao público leitor -espectador?
Não me parece. O código deontológico, tal como código de Processo Penal ou qualquer regra instituída, é contornável. Mas existem violações e violações. Há princípios básicos que jamais devem ser postos em sob o prejuízo de se desvirtuar a natureza do jornalismo leal, rigoroso e imparcial.


15) A universidade é um pilar do jornalismo, ou é um dos factores que associados à prática jornalística se conjugam no bom jornalista?
Temos grandes jornalistas que nunca passaram pelo ensino superior. No entanto, as exigência da modernidade são muitas e requerem instrumentos que um perfil académico dá. A universidade não substitui a prática, o terreno, mas fornece-nos um conjunto de utensílios de reflexão, conhecimento e uma cultura mosaico imprescindíveis para a efemeridade e a rapidez quotidiana.

16) Como é que nasce uma reportagem exclusiva num canal de televisão, no seu caso a RTP?
Nasce como em outro canal qualquer. Uma investigação própria, uma denúncia, uma descoberta de documentos... qualquer exclusivo requer uma fonte própria, informações únicas, corroboradas e legitimadas.

17) Todos os dias tem mais a aprender com os seus colegas há mais tempo no jornalismo?
Todos os dias são dias de aprendizagem. Com os meus colegas mais novos, mais velhos, com os entrevistados... As referências jornalísticas são sempre excelentes consultores.

18) Quem são para si os jornalistas de referencia da actualidade? Porquê?
O Adelino Gomes é um nome incontornável, bem como o de Joaquim Furtado. Hoje em dia, o Eduardo Dâmaso, o Henrique Monteiro... o Zé Manel Fernandes. Pessoas que tiveram um papel determinante no panorama jornalístico português no pré e no pós 25 de Abril. Que tiveram o privilégio de presenciar e fundar jornais maravilhosos, num tempo áureo de turbulência social e mediática.

19) Que perspectivas têm para a sua vida profissional?
Continuar a contar histórias. E escrever muito. A escrita é a linguagem e a aplicação do verbo na qual me sinto mais completa. A minha carreira profissional tem de passar obrigatoriamente pelo prazer. Quando não usufruir do que faço, mudo de emprego, de ofício.

Muito obrigado!

domingo, 15 de agosto de 2010

Entrevista exclusiva a Helena Fonseca - jornalista TVI

(HELENA FONSECA EM DIRECTO)

1) A Helena desde sempre quis ser jornalista. Houve algum motivo especial para esta escolha ou foi mesmo a entrega à profissão?

Comecei a sonhar ser jornalista aos 12 anos, andava no 8º ano. Mas quis ser jornalista de televisão especificamente. A minha professora de Português organizava muitos trabalhos a par ou em grupo. O primeiro desse ano era sobre o artesanato. Fiz com uma amiga minha e tivemos a ideia de entrevistar um artesão de Avintes, em Gaia, que fazia peças em barro extraordinárias. Ambas tínhamos máquinas de filmar em casa, amadoras evidentemente, e realizámos todo o trabalho em vídeo. No final, eu fiz mesmo sozinha uma pequena montagem com um aparelho que o meu pai tinha em casa e que dava para pôr música nos vídeos. Começava com Vangelis e terminava com “A Pronúncia do Norte”, dos GNR. Ficou muito giro! E esse foi só o primeiro. Gostei tanto de fazer trabalhos de reportagem em vídeo que passei a usar sempre esse formato, mesmo noutras disciplinas. E o sonho foi crescendo, cada vez mais maduro…

2) Durante a sua infância quem foram os profissionais de rádio e televisão que mais a marcaram e porquê?

Na minha infância, ainda só sonhava em ser veterinária, só me recordo bem da Manuela Moura Guedes a apresentar o jornal à noite. Via as notícias sempre com os meus avós, na nossa acolhedora sala de estar. Mais tarde, a abertura da SIC com o Emídio Rangel deu um abanão à televisão em Portugal e mesmo à forma de se fazer jornalismo televisivo. Nessa altura, gostava sobretudo do Miguel Sousa Tavares e da Margarida Marante, que faziam programas de debate juntos, (cheguei mesmo a escrever-lhes a pedir conselhos para chegar a jornalista de tv e eles responderam-me) e dos pivots Alberta Marques Fernandes e José Alberto Carvalho. Foram os nomes que me ficaram.

3) Licencia-se em 2003 em Ciências da Comunicação no Porto. Acredita que a vida académica é essencial na construção da sua profissão ou é um pilar que vem reforçar o trabalho em campo?

É um pilar que nos permite, sobretudo, ficar com uma maior cultura geral e que nos permite ter as habilitações académicas que hoje em dia são pedidas. Mas é assim não há muitos anos. Tenho colegas de profissão que nunca frequentaram o ensino superior e não são piores profissionais por isso, nem pouco mais ou menos. Os estudantes de hoje devem ter a noção de que, em jornalismo e dadas as dificuldades do mercado de trabalho, distingue-se quem tem melhor C.V., maior experiência e seja melhor profissional. É bom que se tirem boas notas para conseguir os estágios que algumas faculdades promovem com as próprias empresas, isso é bom. Mas, durante o curso, aconselho os estudantes de jornalismo a realizar trabalhos na área, mesmo com os melhores órgãos de comunicação social. Podem escrever reportagens, fazer, por exemplo, uma entrevista a alguém importante e oferecerem-na, mesmo que a custo zero, a um jornal nacional ou a uma revista. É importante é ser-se expedito e marcar a diferença. Cada passo desses enriquece logo o C.V. As notas académicas nem tanto.

4) Imaginamos a adrenalina dentro de uma redacção. A que horas começa e acaba um dia normal de trabalho para a Helena?

Um jornalista não pode, por norma, contar com uma hora certa de saída. A notícia não tem horas para acontecer e nós queremos é estar onde está a notícia, não é? Isso esbarra quase sempre com a vida pessoal de cada um, mas há que ir estabelecendo prioridades ao longo do tempo. Na TVI, como em quase todas as redacções, há horários rotativos semanalmente. Tanto posso estar fazer manhã-tarde hoje, como para a semana fazer tarde-noite. Depois, a adrenalina vem com a própria notícia. Quando há mais trabalho, trabalho com maior acção, a adrenalina aumenta.

5) Sente que todos os dias tem mais a aprender com os seus colegas há mais tempo no jornalismo?

Sinto que todos os dias temos alguma coisa a aprender, sempre, desde que haja espírito aberto para isso mesmo. Nesta profissão é muito rápida a ascensão, quando fazemos mais directos, quando damos mais vezes a cara por notícias importantes e o trabalho nos corre bem. Mas depois deparamo-nos com um período que nos soa a estagnação se não fizermos nada para o contrariar. Temos sempre que fazer coisas novas, procurar evoluir. Se chegar o dia em que eu achar que já sei tudo, que não tenho mais nada a aprender, nesse momento despeço-me e mudo de profissão. Por outro lado, sou da opinião que só temos a aprender com colegas que sejam para nós uma referência profissional. Não tem que ser necessariamente uma pessoa que trabalhe há mais tempo no jornalismo. Deve é ser uma pessoa com alguma experiência, cuja forma de trabalhar nos agrade particularmente.

6) Até hoje qual foi a peça, reportagem, que a mais marcou pela positiva? Porquê?

Em 6 anos e meio de jornalismo, já tive alguns trabalhos que me deram uma grande realização. Mas do que gostei mais, que não é uma só reportagem, foi de ter acompanhado todo o processo “Apito Dourado”, em Gondomar. Gosto especialmente de trabalhos de justiça. Descobri esse gosto com o “Saco Azul” de Felgueiras. O julgamento do “Apito Dourado” acompanhei-o a par e passo: directos e reportagens todos os dias. Tive de estudar imenso todo o processo, tirar dúvidas com advogados e funcionários judiciais. Era um processo complicado e com uma acusação com 400 páginas, que envolvia figuras com destaque no desporto. Desde a primeira audiência até ao dia do Acórdão, vivi dias de grande realização profissional. Dias em que chegava a casa cansada, mas com a certeza que fiz o trabalho que mais gosto e fi-lo bem feito.

7) Pelo contrário, qual foi o directo, por exemplo que mais embaraço lhe causou (situação anormal), que ainda hoje recorde?

Curiosamente, foi também num tribunal. Trabalhava há pouco tempo, não tinha experiência de tribunais nem dominava a linguagem judicial e chamaram-me às 7 da manhã para fazer directos do Tribunal de Menores e Família do Porto. Iam ser presentes a um juiz os menores acusados de homicídio no caso Gisberta. Eu não fazia ideia, por exemplo, que sendo menores não lhes são aplicadas medidas de coação mas sim medidas cautelares. Não tinha tido tempo de estudar o processo, de preparar-me minimamente… Valeu-me a minha forma de estar em frente à câmara… estava nervosíssima, muito insegura porque tinha consciência que não estava preparada, mas passava uma imagem de segurança. Isso em televisão é uma grande mais-valia, porque, se eu souber muito sobre determinado caso e não o conseguir transmitir da melhor forma, a mensagem não passa e a comunicação não acontece.
(AINDA NO INÍCIO DA SUA CARREIRA)

8) Lembra-se do seu primeiro directo? Que misto de sensações a rodearam naquele momento?

Lembro-me como se fosse hoje! Era um tema descontraído, quando os adeptos do F.C.P. se preparavam para fazer a viagem de camioneta para a Alemanha para ver a equipa conquistar a liga dos Campeões. Eram 9 da manhã. Eu ia fazer o meu primeiro directo e era tudo novidade, até o aparelho, a escuta, que temos que colocar para ouvirmos a emissão…! Mas correu bem. Tive o apoio do Henrique Garcia e da Júlia Pinheiro, na altura, os apresentadores do Diário da Manhã. Eles descontraíram-me. E, mais uma vez, estava nervosa porque sentia a dobrar o peso da responsabilidade, mas disfarcei bem!  No final de cada directo, sentia o corpo a cair de uma forma brutal.com o tempo, percebi que era a adrenalina a descer. Mas, quando se gosta, os directos viciam e hoje é do que sinto mais falta, porque já não faço tantos.

9) Li numa entrevista que a Helena gostaria de se especializar em política. O debate político sempre a fascinou, o que a leva para essa área?

Gosto muito de Política. Gosto especialmente daquele desafio de, em reportagem, conseguir descodificar os mitos políticos, “brincar” com os temas. Para mim, é a área com mais potencial para se fazer notícia e que não é aproveitada da melhor maneira. Se pensarmos bem, qualquer tema forte da sociedade serve para fazer uma reportagem, uma entrevista com um político. Quer do Governo quer da oposição ou, por exemplo, de uma autarquia. Qualquer desses bons temas presta-se a provocar uma resposta de um ministro, de um responsável pela nação que tem que prestar contas ao país. E, se falarmos de Assembleia da República, aí, então, há bons motivos para reportagem todos os dias. É um grande desafio saber como explicar a política que é praticada ao grande público.

10) O jornalista é também aquele que viaja muito, quiçá, até para fora do País à procura da notícia. Quais foram os países que já visitou, enquanto profissional de jornalismo?

Estive já por 2 vezes em Barcelona, em diferentes trabalhos. A Paris já fui umas 7 ou 8 vezes, um verdadeiro corre-corre! Estive ainda em Istanbul, em S.Paulo e em Dresden, na Alemanha.

11) Sabemos que para o jornalista o seu código deontológico é uma espécie de bíblia sagrada. Agora pergunto Helena, acredita que a maioria das notícias que são levadas até nós, público, têm na base esse mesmo código? Não acha que chegamos ao ponto, de que «o que importa é vender»?

Isso parte de cada profissional e de cada órgão de comunicação. Há uma linha, cada vez mais ténue entre conseguir prender a atenção do espectador e entre as sensações que podemos criar no espectador para mais gente ter curiosidade na reportagem e vender mais. Por vezes até me acho demasiado fundamentalista, mas com o tempo percebo que, trabalhando numa empresa privada, há que tentar conjugar da melhor forma esses dois objectivos: preocupo-me em ser correcta nas informações que passo e, ao mesmo tempo, também quero que a reportagem tenha muita audiência. É perfeitamente conciliável. Mas há, de facto, quem queira apenas vender e não se preocupe com o rigor dos dados e, na reportagem, dê mais ênfase a aspectos menos importantes da notícia mas que provocam mais as tais sensações no espectador. Um jornalista deve, quanto a mim, respeitar as principais regras do código deontológico, especialmente porque tem a imensa responsabilidade de transmitir mensagens para as massas e para as minorias, mas o espectador, as pessoas individualmente têm que começar a tornar-se mais activas nesse processo. Têm que saber pensar nas mensagens que recebem dos media e não absorver tudo o que lhes é dado. Claro que, no jornalismo, como em todas as áreas, há sempre quem se aproveite das fragilidades do receptor em benefício próprio.

12) Nos últimos tempos tem-se vindo a assistir a um certo atrito entre jornalistas e políticos. Porque será na sua óptica, que isso acontece?

Acontece porque, finalmente, o jornalismo começa a ter menos medo da política. É como eu dizia há pouco, só não se “brinca” mais com a política e com os políticos porque há uma certa inibição, uma sensação de hierarquia que, na nossa profissão, não deve existir como enquanto cidadãos comuns. [Convém explicar que quando falo em “brincar”, refiro-me por exemplo a um registo de reportagem mais irónico, que transmita as muitas incoerências que existem na nossa política de uma forma mais afirmativa e que provoque o espectador a pensar] O jornalista tem que encarar o político como aquele ou aquela que tem por obrigação governar e dar satisfações do que faz a quem o elegeu. Tem que interiorizar que esse é um poder muito útil à governação. Não digo que os jornalistas sejam fiscais dos políticos, mas podem questioná-los sempre que se justificar (e razões para isso infelizmente há muitas vezes) em nome de cada contribuinte. É a nossa função, fazer as perguntas para obter as respostas. Acho que a geração mais nova já está muito mais ciente disso e já não olha para os políticos só como “os senhores que mandam”. Felizmente.

13) Caso fosse convidada, aceitaria o convite para dar palestras ou quiçá leccionar alguma cadeira no curso de comunicação?



Desde que fosse conciliável com os meus 1500 projectos, tenho a certeza que sim!  Dei 3 aulas sobre jornalismo ao 8ºano e confesso que adorei a experiência. Acho que, quando gosto verdadeiramente do que falo, consigo transmitir a minha mensagem. Ao princípio tive receio de não conseguir captar a atenção de uma turma de 30 adolescentes, mas, quando percebi que ficaram todos caladinhos a ouvir-me, fiquei muito contente.
14) Para terminar esta entrevista, que balanço faz da sua carreira, enquanto jornalista, ao longo destes 7 anos?

Quase 7 anos… Passou muito rápido, essa é a verdade! Como comecei a trabalhar permanente em directos e sempre de manhã, que é quando é mais difícil porque a informação, de forma geral, é muito escassa, e estive nessa situação durante 5 anos, consegui ganhar muita experiência com a câmara… temos uma óptima relação!  trabalhava a um ritmo alucinante, horas a fio, mas há uma altura em que o corpo começa a dar avisos que não pode ser assim. Desde que deixei as manhãs da TVI, tenho uma vida mais normal. Não faço directos todos os dias, é certo, mas tenho tempo para procurar as minhas histórias, fazer mais trabalho de informação ainda que, por questões de agenda, não seja muito fácil. Tento conciliar as notícias do dia-a-dia ditas obrigatórias com as reportagens exclusivas que consigo através do trabalho com as fontes. Mas como desacelerei o passo, também começo a sentir necessidade de aprender mais qualquer coisa… quiçá tirar Direito, já que gosto tanto de tribunais!