domingo, 16 de janeiro de 2011

Entrevista exclusiva ao jornalista e pivô de informação da TVI, Marcos Pinto

1) Marcos quando era pequeno e nas redacções da escola o mandavam falar sobre o que gostaria de fazer no futuro, o quê que escrevia?
Não me lembro o que escrevi no caderno da escola, mas lembro-me que este miúdo quis ser militar e fazia paradas militares, não só em família mas também no centro da aldeia, para toda a gente ver. Numa fase posterior, ainda pensei em ser padre, era acólito e achei que podia progredir na carreira. (risos) E depois, um teste psicotécnico muito estranho, no final do 9º ano, sugeria que fosse camionista. Bom, mas a estrada a vida tomou, claramente, outra direcção. Em comum, só mesmo o gosto na condução (risos).

2) Com que idade se inicia no mundo do jornalismo. Rádio? Em que circunstâncias?
Comecei com 21 anos, dois meses depois da conclusão da licenciatura. O primeiro mês foi para enviar currículos e tive uma resposta improvável, pelo menos, quanto à expectativa que tinha. Foi um convite para estagiar no (já extinto) semanário Tal&Qual, isto em Fevereiro de 2002. O estágio só durou um mês, mas continuei a colaborar em regime freelancer, pelo menos um ano. Foi uma boa experiência, até porque o enquadramento da notícia era diferente do que é habitual e as histórias eram contadas com muita garra.

3) «A minha vida é a rádio» afirma o Marcos no seu blogue pessoal. Na sua óptica um bom jornalista de televisão, por exemplo, sente sempre a necessidade de se manter ligado à rádio? Porquê?
Quando afirmo que a minha vida é a rádio, é porque, a seguir ao primeiro estágio, não hesitei em trocar o jornal por um projecto de uma rádio online de um instituto universitário. Em 2002, uma rádio na internet ainda era uma novidade e a audiência era residual. Mas lá está, como era rádio, nem pestanejei e ganhei as primeiras luzes sobre o mundo do éter. Mas saliento também que, passava as minhas férias universitárias, ao leme de um microfone de uma rádio local na Beira-Alta. Lá está, no verão, enquanto todos jogavam à bola e mergulhavam na piscina, eu gostava mesmo era de passar música.
Quanto à segunda parte da pergunta, digo que sim, mas não é preciso estar obrigatoriamente ligado, quando se fica com a escola da Rádio. O que eu digo é quem trabalha na TV, é claramente um melhor jornalista, se tiver passado primeiro pela Rádio.

4) NO AR, 100 Histórias da Rádio". Como é que nasce o mote para este livro?
A ideia nasceu quando fiz um programa de autor no Rádio Clube Português, durante dois anos, nas tardes de fim-de-semana. Chamava-se “Toda a Tarde” e foi, até hoje, o meu melhor momento. Tinha liberdade de fazer tudo e pensei que, estando no RCP, numa estação com tantos anos de histórias, valia a pena recordar as grandes histórias e figuras da Rádio. Saliento, porém, que o livro não recuperou as entrevistas na Rádio, fiz questão de voltar a encontrar-me com os mesmos intervenientes, fora do estúdio, numa bela conversa de café. O livro foi um projecto de vida que consegui realizar.

5) Todos dizem que para se ter uma voz bem colocada é necessário ter uma voz colocada! Que cuidados a ter com ela?
Não concordo que a voz tenha de ser bem colocada. A voz é a voz, ponto. E todos temos uma boa voz e quem nos diz o contrário, é preciso provar. Agora, claro, há vozes mais melodiosas do que outras. E se temos uma voz mais aguda, podemos adaptar o tom ao ritmo e à modulação. Acima de tudo, temos de saber cuidar, tratar bem da voz. Costumo dizer, em jeito de brincadeira que se a voz tivesse personalidade jurídica, como é, por vezes, tão mal tratada, havia muita gente a responder em tribunal.

6) Como é que foi passar pelas revistas de Televisão TV 7 Dias e TV Guia com registo completamente diferente do que faz habitualmente?
Concordo, foi um registo absolutamente diferente, que aceitei, mais por imposição de vida do que, por vontade. Ainda assim, não me arrependo nada. Até porque no mundo da TV, há entrevistas e reportagens magníficas que se podem fazer a protagonistas e acontecimentos. Entrevistei o Herman José quando ele fez 50 anos, estive em Madrid com o Paulo Pires ou então com o Nuno Norte, o primeiro vencedor do “Ídolos”, em Londres, quando ele gravou o primeiro disco. Foram belos momentos. Ou seja, não importa o meio mas sim o que podes fazer em comunicação.

7) Como é que vê a designação 4.º Poder atribuídos aos média na actualidade?
Quarto poder? Não diria que é o primeiro, mas é o segundo ou terceiro, em muitos casos. Quem contaria os erros da justiça? Quem falaria dos casos de corrupção entre empresas e políticos? Como teria sido o processo Casa Pia sem os media. A Comunicação social de um país é o reflexo do grau de democracia e a liberdade de expressão e informação. No fundo, ajuda uma sociedade a ser melhor quando as pessoas são informadas sobre o que se passa, longe dos olhos, mas perto da consciência cívica.

8) Um pivô da informação tende a manter um ar isento, directo. No entanto e nomeadamente no «Discurso Directo» no TVI 24 ou programas similares em que telespectadores entram no ar, muitas vezes com uma opinião imprevisível, quer nos contar umas das intervenções mais caricatas onde conter o riso foi quase ou mesmo impossível?
Costumo dizer que o discurso directo é o que mais se aproxima de um programa de Rádio na TV. Não temos rede, nunca sabemos o que vai acontecer. Sabemos como começa mas nunca como acaba. Ah, têm sido muitos, os momentos divertidos, mas destaco um, na véspera de um Porto-Benfica, quando um telespectador disse que eu era benfiquista e que era uma vergonha estar a moderar a conversa, e que não era isento. Porquê? Era a gravata vermelha que estava a usar. Já viram o cabo dos trabalhos que o guarda roupa da TVI me arranjou? (risos)

9) Na «Alma dos Anjos». Pode-nos falar um pouco da forma como entende a sua religião. Acredita que existem milagres e que a nossa cultura contemporânea se constrói um pouco em volta dessas soluções milagrosas?
É o titulo de uma biografia que escrevi sobre os 10 anos de carreira sobre os “Anjos” enquanto projecto musical ímpar em Portugal. Os fãs gostaram muito do livro e isso deixou-me muito feliz. Sim, acredito em milagres e que também podemos fazer milagres. Sou um homem com muita fé. Em mim, também, há dias melhores que outros mas sim, tenho fé, sou católico não praticante mas acredito em Deus. Mas a igreja devia ser mais comunicação e gosto de ir a uma missa, para ouvir uma homília. Torna-se difícil quando o padre é uma “grande seca” (risos). Mas confesso que me afasto da Igreja em assuntos tão fracturantes como o uso do preservativo ou o aborto, em determinadas situações.

10) O espírito de Natal esteve mais aceso do que nunca na sua vida este ano, ou não fosse o Marcos, um dos rostos de «Histórias de Natal». O que recorda dos seus natais na Alemanha, rodeados provavelmente de muita neve?
Deixei a cidade de Hamburgo, aos 4 anos, muito novo vim para Portugal. Creio que só passei um natal na Alemanha e tenho uma vaga ideia de muitos presentes só para mim. É que filho único tem as suas vantagens (risos). Mas guardo uma prenda incrível, até hoje: um triciclo. Por falar nisso, o volante precisa de ser mudado.

11) Ainda acredita no Pai Natal?
Claro que sim. O Pai Natal é aquilo que cada um quiser. E quando a vontade é muita, o sonho comanda o Natal. Como nota de rodapé, o Histórias de Natal correu muito bem e teve audiências fantásticas no TVI24.

12) Marcos, grande reportagem ou pivô da informação? Porquê?
Pivô, confesso! Porque os dias não se repetem, é tudo imediato, em directo. Mas nunca digo não a uma grande reportagem. Não há nada melhor do que um jornalista contar uma história grande. É magnifico.

13) Apesar da TV, o bichinho da rádio contínua lá, os ouvintes terão novidades já em 2011 do Marcos na rádio?
Já disse que a rádio é a minha vida. 2011 começa sem novidades mas gostava muito de voltar à Rádio, ter uma colaboração pontual, por exemplo. Mas se tivesse de optar entre Rádio e TV, seria… Rádio. O que mais gosto é passar música e contar uma história pelo meio. E sorrir na Rádio, é maravilhoso.

14) Se eu lhe pedisse a playlist da sua vida num extensão de 5 músicas, quais seriam elas e porquê?
Que pergunta difícil. Não são 5, são muitas mais. Mas aceito o desafio, cá vai:


- Peter Gabriel “The Book of Love” – fala de amor, que é o livro da vida
- LightHouse Family – “Ocean Drive” – há uma parte da música que diz faz tanto do tão pouco. “O céu é azul e sol brilhará sobre tudo o que tu fazes”
- Rui Veloso “Negro Rádio de Pilhas” – preciso de explicar esta? (risos)
- Oasis “Don´t Go away” – bem sei que o tempo é coisa preciosa, mas às vezes, precisamos de tempo para fazermos as coisas bem feitas
- Tiago Bettencourt - “Canção simples” – porque a simplicidade é um grande segredo e uma grande forma de resolver as coisas.
Só 5? Que pena. Atenção, o critério teve a ver com as primeiras cinco que me vieram à memória.
15) Uma curiosidade que muitos dos nossos leitores têm é perceber como é que os jornalistas que fazem pivô se sentem todos «engravatados». Provavelmente no caso do Marcos a mudança foi enorme em questões do vestuário da rádio para a televisão. Como se sente? Considera que o facto de o jornalista - apresentador apresentar-se de fato e gravata é algo relevante, ou antes pelo contrário, só serve para embelezar o ambiente?
Não vamos estar com meias medidas. Claro que é fundamental. Televisão é imagem, temos de estar maquilhados e bem vestidos. Eu fiz Rádio de calções e chinelos porque a roupa é a voz. Agora em TV, tem de ser mesmo. Quem nos vê é mais exigente do quem nos ouve.

16) «Marcos Pinto no ar» é um projecto para continuar?
Não tenho tido muito tempo, confesso. E tenho muita pena. Mas prometo, sempre que descobrir uma música fantástica, irei publicá-la no blog e partilhar com todos.

17) Projectos para 2011? Alguns em mente?
Sim, escrever um livro. Sem dúvida. E talvez, haja alguma novidade no TVI 24. Fiquem atentos. Justificar completamente


domingo, 9 de janeiro de 2011

Entrevista à jornalista da RTP, Daniela Santiago

Jornalista da RTP foi distinguida pela Unesco e pelo ACIDI (Alto Comissariado para a Imigração e Dialogo Intercultural).

Daniela Santiago ganhou o Prémio de Jornalismo Direitos Humanos e Integração, atribuído pela Unesco e pelo ACIDI (Alto Comissariado para a Imigração e Dialogo Intercultural) relativo a 2008. A reportagem "Missão Reomau", dá conta de umas férias radicalmente diferentes e solidárias feitas por um grupo de dez pessoas que pagou para reconstruir uma maternidade no Senegal, sob a égide da AMI. "Estou muito contente", garante Daniela Santiago, "porque é o reconhecimento do meu trabalho e do trabalho solidário destas dez pessoas que pagaram para ir ajudar outras no Senegal".


1) Daniela se a desafiássemos a tocar uma peça de Mozart no piano sentia-se capaz, ou o Conservatório de Música já ficou arrumado na sua gaveta das recordações?
DS) Claro que tocava... mas preferia as Invenções de Bach (a nº 9 ou nº13, as minhas preferidas) ou as três Gimnopedies de Erick Satie. Pianista durante 12 anos, sempre pianista. As minhas mãos nunca vão esquecer o peso das teclas de um piano, do meu piano. Aos 18 anos tive de fazer uma escolha... optei pelo Jornalismo... não segui para o Superior de Música.

2) Como foi crescer na Covilhã? Ainda se lembra por exemplo dos seus Invernos rodeados de neve à volta da lareira?
DS) Lembro-me da neve. Nunca tive lareira. Sempre vivi no centro da cidade, num apartamento. A ideia que viver no interior corresponde a uma vida no campo, rodeada de galinhas e vacas é completamente errada (o que não significa que isso não seja bom, adoro campo e animais). Viver numa cidade como a Covilhã permitiu-me fazer o secundário ao mesmo tempo que o Conservatório em piano, cantar no côro e dar concertos, fazer rádio, sair com amigos, ir à discoteca e ser uma das melhores alunas na escola. Se estudásse em Lisboa passaria o tempo no trânsito... e não teria tido tempo para metade. Lembro-me de não ter escola devido aos nevões; de ir para a janela ver os vizinhos cairem nas escadas em frente; da Serra da Estrela “sempre a olhar para mim”; da água congelada nos canos no Inverno; do cheiro a queijo fresco; da leiteira que tocava à campainha; dos pintainhos na praça às segundas-feiras (às compras com a minha avó “Lula”; do “madeiro” de Natal e da Missa do Galo; de toda a minha família que ainda vive na Beira Interior; dos meus amigos... lembro-me e tenho saudades de tudo. Tenho, acima de tudo, grandes e boas memórias. Não nasci lá, sou lisboeta, já vivo há mais anos em Lisboa do que vivi na Covilhã (16), mas continuo a dizer que sou Covilhanense! Beirã.

3) Subiu muitas vezes a Serra da Estrela? Que recordações guarda desta sua infância no interior do País?
DS) Subi algumas... algumas delas a pé. No Verão, com amigos! Afinal, a Covilhã fica numa das encostas da Serra. No entanto, não era assim tão frequente. Quando temos algo mesmo à nossa frente, neste caso à nossa volta, habitualmente não lhe damos valor. Acredito que muitos lisboetas tenham ido à Estrela mais vezes do que eu.

4) Aos 18 anos regressa a Lisboa onde acaba por concluir o seu curso superior na área do jornalismo. Qual foi a sua 1.ª experiência profissional após a conclusão do seu curso?
DS) Vim para Lisboa aos 18 anos. Candidatei-me para Comunicação Social no ISCSP, da Universidade Técnica de Lisboa, e entrei (primeira opção). Estive na Faculdade de 92 a 96 e entrei na RTP quando terminei a licenciatura... primeiro como estagiária, depois como “recibo verde”... e, finalmente, como funcionária no quadro da empresa. Já lá vão 14 anos!


5) 4 de Março de 2001. Uma data que nunca será esquecida pelo menos para aqueles que viram partir os seus entes queridos. Como é que um jornalista consegue no meio de tanto sofrimento, impotência, lidar com as pessoas e sobretudo conseguir filtrar essa dor que se abateu em detrimento de toda esta tragédia?
DS) Essa foi exactamente a minha investigação para mestrado: “O Reconforto da Televisão – uma visão diferente sobre a tragédia de Entre-os-Rios”. A pergunta poderia levar dias a responder... a minha tese tem cerca de 300 páginas.
Escrevi sobre isso para o Mestrado em Comunicação, Cultura e Tecnologias de Informação, no ISCTE. Debrucei-me sobre isso mais tarde no livro sobre o Tsunami... no projecto para o meu doutoramento em Sociologia (que ainda não concluí). Voltei a insistir na objectividade, no “falso automatismo”, na credibilidade que urge e no respeito pelos jornalistas no “Comunicação e Jornalismo na Era da Informação” e, mais recentemente, no “Ideias Perigosas para Portugal”... a minha opinião está publicada e mais que partilhada. Digo apenas que os jornalistas deveriam dar-se ao respeito... para poderem ser respeitados. Todos os telespectadores entendem que numa situação de dor não podemos ser sujeitos passivos... máquinas sem sentimentos. Se nos ouvirem, “virem”, “lerem” como jornalistas credíveis, experientes... serão informados da mesma forma, sem falsas objectividades e certezas impossíveis de fornecer. TODOS somos seres humanos.



6) «15 Dias no Sri Lanka depois do Tsunami». Que imagem encontrou quando chegou a este local? Como é que uma jornalista, uma mulher, uma mãe, uma filha assiste a este cenário tão dantesco?
DS) Ainda não era mãe nessa altura, a minha filha nasceu em 2006. No entanto, nada foi diferente por isso. Sempre fui muito sensível à desgraça, à tristeza, à dor alheia. Desde miúda que tento ajudar os outros (pessoas, animais... acusam-me muitas vezes de ser “lamechas”, sensível, “de lágrima fácil”). Não considero que assim seja, sou sensível, sim! Sou genuína, verdadeira, amiga, protectora, “mãe-galinha”, faço minhas as dores dos outros, vivo tudo com intensidade máxima. Vivo, acima de tudo! Sou eléctrica, muitas vezes sou penalizada e prejudico-me por ter o “coração na boca”. Reagir a quente, dizer tudo o que sinto e vejo. Às vezes é mau, arrependo-me e peço desculpa. No entanto, considero que, na esmagodora maioria das vezes, é muito bom! Nunca fico com nada por dizer, por sentir, por viver... No Sri Lanka descobri o Inferno. A morte e a vida. A tristeza máxima e a alegria do recomeçar de novo... do Sri Lanka vim uma nova mulher... No livro que escrevi “Inferno no Paraíso – 15 dias no Sri Lanka depois do Tsunami” fiz a catarse da Daniela Santiago mulher, desmistifiquei a Daniela Santiago jornalista... e o que é ser jornalista, mulher, ser humano... no Inferno em Vida!

7) Crianças que perdem os pais, que fiquem sem ninguém para as ajudar a crescerem. É mesmo o inferno no paraíso?
DS) É pior... porque não estamos mortos.



8) «Da objectividade total à expressão das emoções». O bom jornalista será aquele que se centra na objectividade total ou isso é impossível de acontecer na prática, uma vez que os jornalistas são seres mortais comuns, nutridos de espiritualidade?
DS) Peço desculpa por responder com uma citação... mas é minha, cito parte do texto que escrevi para o livro “Ideias Perigosas para Portugal”, 2010, Edições Tinta da China: A OBJECTIVIDADE dos Jornalistas! A OBJECTIVIDADE que tanto se apregoa aos “sete ventos” sem questionar se alguma vez é isso que APENAS importa quando se faz reportagem… e falo de REPORTAGEM, não de “notícias” feitas por “pés de microfone”, mensagens que outros fazem passar por pessoas que se auto-denominam jornalistas, mas não são mais que “mensageiros” de falsas “notícias”. Eu sei. Bem sei que, há muito, racionalmente, se deixou de insistir na “OBJECTIVIDADE TOTAL”. Pelo menos, assim acredito. Se alguém continua a defender tal aberração, ou seja, que é possível um ser humano, um Homem, ser “totalmente objectivo”, não vive decerto no mesmo Mundo que eu. Será, no entanto, correcto continuarmos a insistir com tanta veemência na GRANDE importância da objectividade no jornalismo? JORNALISMO, não “simples transmissão de informações de outrem”. Não seria mais profissional, ético, correcto… Não seria “mais objectivo”, assumir perante os leitores, ouvintes e telespectadores… Assumir, abertamente, que os jornalistas, como Homens e Mulheres, seres humanos como todos os outros profissionais, são exactamente como TODOS os seres humanos? É certo que TODOS os jornalistas (não mensageiros que proliferam nos media de hoje em dia) devem cingir-se ao trabalho, ao relato, ao testemunho mais objectivo que consigam. Devem lutar por ser isentos, o mais que consigam mas, claramente, assumindo à partida que, tal como escreveu o laureado com o Nobel da Paz Elie Wiesel, “aquele que ouve uma testemunha torna-se, ele próprio, numa testemunha”. Que relato mais fiel, que experiência pode um leitor ou um telespectador desejar para além do relato de alguém que, o mais fielmente possível, tenta contar aquilo que viu, ouviu, testemunhou… através dos seus olhos, ouvidos, olfacto… ou mesmo tacto? Não será muito mais enriquecedor contar com a experiência de alguém que, assumidamente, por força da profissão de jornalista, já “cobriu” inúmeros acontecimentos, fez parte da própria história da humanidade, do país ou da região (não são apenas os grandes acontecimentos que fazem os grandes repórteres)? A opinião de alguém que dedicou a vida ao jornalismo não será digna e fidedigna para quem a ouve? Não será o testemunho do jornalista mais fiel e imparcial que o comentário, as ideias opinativas que todos os dias se amontoam, em discursos elaborados, nos jornais ou em espaços informativos dos canais de televisão? (...) A objectividade “encapotada” é pior que assumir que os jornalistas têm o dever de isenção, devem tentar ser o mais objectivos possível… mas daí até não terem qualquer interferência na forma como a notícia chega até aos leitores, ouvintes e telespectadores vai a distância de Portugal à Nova Zelândia.
No meu, modesto, entender, a grande preocupação de todos os que trabalham nos meios de comunicação social, tal como daqueles que confiam nos jornalistas para se manterem informados, deveria passar pela CREDIBILIZAÇÃO da profissão e dos profissionais da área. Não é só o mundo da Política, a Justiça, o sector económico-financeiro… que precisam de CREDIBILIDADE.


O jornalismo atravessa um período difícil. O jornalismo encara dificuldades como nunca enfrentou. Falta credibilidade. Credibilidade precisa-se, com urgência, para quem ama o Jornalismo como eu. Confiar no bom trabalho de um jornalista não exige que esse mesmo jornalista seja um AUTÓMATO, uma máquina que transmite, exactamente, o que vê, o que ouve, sem sentimentos, coração, alma… ou discernimento do que está certo ou errado. Não se querem desvios ou interferências, mas também não se deseja hipocrisia, superioridade e arrogância despojada de qualquer sentimento humano, que nos torna a todos diferentes, e por isso mesmo, únicos e “ricos” na vasta heterogeneidade que é o Mundo em que vivemos. A experiência, a visão transversal da passagem pelos mais diversos cenários, momentos e registos, são mais valiosas que qualquer tentativa de isenção e imparcialidade totais, que, caso fossem possíveis, não fariam mais que retirar a importância, o “cunho” Humano e a emoção real desses próprios acontecimentos reduzindo-os a “pedaços de gelo”, que derretem e se diluem da memória de quem por eles passou ou ouviu falar.

9) Comunicação e Jornalismo na Era da Informação. O facto de a informação estar em constante difusão fez com que o jornalista perdesse a primazia de trazer ao público a notícia em 1.ª mão. Quais os prós e contras na sua opinião desta nova realidade?
DS) Não concordo com a primeira afirmação. O jornalista não perdeu a primazia de trazer ao público a notícia... o público é que poderá estar a ganhar novos “repórteres”, “cidadãos jornalistas”, e isso, poderá ser positivo, mas também muito negativo para a informação credível e cuidada. Só o tempo escreverá sobre o futuro do jornalismo, da televisão e das “auto-estradas da informação”. Para já, olho para esta realidade com prudência, mas também com a curiosidade de um admirável mundo novo por explorar. O futuro vai, decerto, passar por aí... pela complementariedade, pelas múltiplas plataformas de comunicação...


10) O quê que sente quando parte para uma nova reportagem exclusiva. Como é que nasce a verdadeira reportagem exclusiva, e que contornos pode alcançar?
DS) Depende das reportagens... mas sinto sempre um “friozinho na barriga” como na primeira vez. Sou jornalista por paixão e é na reportagem que mais me realizo. Se souber que vou encontrar dor, sinto ansiedade... Se souber que vou para Àfrica, tenho saudades antecipadas porque adoro aquele Continente... Na esmagadora maioria das vezes, não sei o que vou encontrar mas vou sempre ansiosa por lá chegar! Os resultados... vêm depois e são sempre imprevisíveis.

11) Pelos instantes em que conviveu com Barack Obama na mesma sala, que impressões retira da sua personalidade? Acredita que possa vir a tornar-se num líder carismático, ou já o é?
DS) Ao longo de 14 anos já estive com, e entrevistei, pessoas fantásticas, marcantes, seres humanos admiráveis, ditadores “detestáveis”, contadores de histórias apaixonantes... Famosos ou anónimos, mas sempre figuras únicas. Obama foi mais uma dessas pessoas. Fiquei muito satisfeita por ter tido a possibilidade de fazer reportagem em directo da primeira visita de Obama a Portugal. Ele é, de facto, UMA FIGURA. Tem carisma. É simpático. Afável. Estabelece contacto fácil, tem presença, credibilidade.
12) No meio de tantas tarefas é ainda professora universitária. Enquanto professora quais são os principais valores que tenta incutir aos seus alunos, futuros jornalistas deste país?
DS) Que se entreguem de corpo e alma ao jornalismo, mas também à difícil tarefa de serem “Seres Humanos”, com “S” e “H” maiúsculos. Falo com eles como jornalista, comunicadora... nunca me assumo como professora, académica, apesar de ter essa vertente na minha carreira (deixei o doutoramento a meio, está em stand by, espero terminá-lo quando a minha filhota for mais velha). Peço-lhes para terem a verdadeira noção do poder que um jornalista tem nas mãos, da importância da carreira, da responsabilidade... As minhas aulas são uma troca de experiências, de histórias, de ética e responsabilidade.

13) Qual é a sua posição relativamente ao novo acordo ortográfico? Favor, contra, mais um factor relativo à questão da globalização?...
DS) Esse é outro tema que prefiro não comentar. Como já deve ter percebido, ainda escrevo “sem acordo “! Não me imagino a escrever “ação”!
14) Enquanto jornalista que países já visitou e que peças mais a marcaram até ao dia de hoje?
DS) Bem... viajar é uma das minhas paixões. Viajo em trabalho, mas também em lazer, nas minhas férias... Rússia, Estónia, Letónia, Lituània, Alemanha, R. Checa, Aústria, Itália... Brasil, México, Cuba... Egipto, Argélia, Tunísia... Senegal, Mali, República Democrática do Congo, Moçambique, Suazilândia, África do Sul... Maldivas... Etc, etc, etc... Reportagens/acontecimentos: O Tsunami no Sri Lanka; os madeireiros portugueses e pigmeus na RDCongo; a “Missão Réo Mao - Aventura Solidária da AMI”, no Senegal (galardoada com um Prémio de Jornalismo da UNESCO e ACIDI, em 2009); os portugueses no Reino da Suazilândia... e uma grande reportagem sobre negligência médica durante o parto, “Condenados à Nascença”... as histórias do dia-a-dia!
15) Com alguns anos de jornalismo na sua carreira profissional que balanço faz da sua carreira, voltaria a fazer tudo da mesma forma?
DS) Quando se volta atrás... não é para repetir o mesmo, mas não me arrependo de nada do que fiz, só do pouco que deixei por fazer. Amo a minha profissão, ainda é cedo para balanços!
16) Para finalizarmos que conselho ou conselhos gostaria de deixar aos futuros comunicadores deste país?
DS) Leiam, leiam muito. Comuniquem, comuniquem muito. Informem-se. Façam tudo de uma forma apaixonada, esclarecida e responsável... de resto, sigam a intuição e façam por ser felizes! Boa sorte!


EM REPORTAGEM: «O SANGUE DA FLORESTA».